Em todos os momentos da História, seja na Antiguidade, na Idade Média, ou no nosso tempo, são as mesmas paixões e os mesmos desígnios que inspiram os humanos. Entender a História é entender melhor a natureza humana.

19 de agosto de 2011

A Vida na Idade Média

Tanto no campo, como na cidade, o aborto era prática do quotidiano, mas feito em segredo (...) As receitas eram as do costume: beberagens de camomila, gengibre e fetos, assim como operações perigosíssimas. Sobre os motivos que levavam a tal atitude, pouco se sabe (...), muitos seriam consequência de uma violação. Aqui, a Igreja contradizia-se, pois condenava a violação, mas, ainda mais, o aborto. A infertilidade, assim como o aborto espontâneo, eram considerados da exclusiva responsabilidade da mulher.

Como lidar com o nascimento de gémeos? Não eram eles a prova de que a mãe fora infiel ao marido, pois teria sido fecundada por dois homens? Ou era um dos recém-nascidos o sósia do original, gerado pelo Diabo? E qual deles? Pouco se sabe sobre o nascimento de gémeos, mas o facto de eles raramente fazerem parte da árvore genealógica dos nobres aponta para o infanticídio - um crime gravíssimo, mais grave do que o aborto, mas talvez a única possibilidade de salvar a honra da família.

O cabelo solto nas mulheres era um símbolo sexual, significava a tentação feminina, como a da Eva, de Maria Madalena, ou da rameira. As mulheres tinham de cobrir o cabelo em público, velar por ele como se de um bem pessoal se tratasse. Ainda no início do século XX, as mulheres que saíssem de casa sem chapéu ou lenço na cabeça podiam ficar com a reputação estragada.

A opinião sobre as mulheres era ditada por prelados, isto é, homens solteiros, os únicos a quem se dava crédito, no mundo cristão. E a opinião era arrasadora: a mulher era uma obra do Diabo, que incitava ao pecado, o símbolo da impureza, provada pelo sangue que ela expelia, a loba cruel e insaciável, consumidora de homens.

Excertos de Das Leben im Mittelalter, de Robert Fossier, título original: Ces gens du Moyen Âge (tradução minha, do alemão). Existe a versão portuguesa, com o título Gente da Idade Média:



4 comentários:

antonio ganhão disse...

Quem diria que a Idade Média tinha a sua sabedoria?

Cristina Torrão disse...

:P

George Sand disse...

É um tema fascinante a história das mentalidades.
Vou tratar de encontrar o livro. Em françês ou português. Infelizmente, não leio alemão

Cristina Torrão disse...

Sim, o livro foca as mentalidades, principalmente, a do povo, que, normalmente, é esquecida e que, muitas vezes, não coincidia com a da nobreza ou do clero. E o povo representava, na altura, mais de 90% da população.

A versão alemã não passa de uma tradução, como a portuguesa, por isso, também estará bem servido com ela. Publicarei mais passagens.