Em todos os momentos da História, seja na Antiguidade, na Idade Média, ou no nosso tempo, são as mesmas paixões e os mesmos desígnios que inspiram os humanos. Entender a História é entender melhor a natureza humana.

1 de julho de 2013

O Herdeiro do Vinho do Porto




Este livro devia ser traduzido para português. Fala-nos de um arquiteto alemão de trinta anos que herda de um tio, que ele mal conhecia, uma Quinta no Douro. É sem grande interesse que ele se dirige ao nosso país, pois nada sabe sobre Portugal, nem percebe de vinhos.

Mas (e como não podia deixar de ser) a região do Douro sedu-lo. O problema é que se vê inserido numa série de peripécias, correndo, inclusive, perigo de vida. E chega à conclusão de que o tio foi assassinado.

A partir daqui, desenvolve-se uma história interessante sobre um jovem alemão revolucionário (o tio) que veio para Portugal, na altura da Revolução dos Cravos, à procura de aventura. Acaba por fazer amizade com um revolucionário português, com o inevitável nome de Otelo, e os dois vão, em pleno Verão Quente, trabalhar para uma cooperativa de vinhos alentejana. O alemão encanta-se de tal maneira com a indústria vinícola, que reclama a sua parte da herança, na Alemanha (e que ele havia recusado), para comprar a Quinta no Douro. Mas há um problema: Otelo, que o acompanha ao Norte, fez um inimigo na guerra colonial, um agente da PIDE que, décadas depois, lhes trará dissabores, assim como ao sobrinho herdeiro.

Não sendo uma grande obra literária, este livro compensa pelo enredo interessante e pelo charme de  apresentar os portugueses de fora, ou seja, através dos olhos de um alemão que, como disse, nada sabe sobre o nosso país. Como exemplo, aqui vão duas passagens (traduzidas por mim):

Nicolas guiou bastante tempo atrás do camião. A estrada não oferecia visibilidade, o que, aliás, não impressionava os outros condutores que ultrapassavam, num verdadeiro desafio à morte, em curvas apertadas, para tornarem à sua faixa no último momento antes do choque frontal. Os camiões que vinham em sentido contrário passavam a milímetros do seu carro, num ronco infernal. Aquilo não era para os seus nervos, ele nunca conseguiria viver num país de condutores doidos varridos.

Na próxima passagem, ele acaba de conhecer uma alemã que vive em Portugal e por quem se sente atraído:

- Por isso, tirei o curso de Românicas, espanhol e português. E, na minha primeira estadia em Lisboa, apaixonei-me pelo Fernando Pessoa.
Nicolas estremeceu. Era preciso ter azar! Sempre que se interessava por uma mulher, surgia um homem pelo meio, já com a belga tinha sido a mesma coisa.
- Não o conheces?
- Não – respondeu Nicolas irritado. – Ainda não conheci muita gente, por aqui, só a que está ligada à Quinta.
Rita desatou às gargalhadas.
- Não conheces Fernando Pessoa? Não o viste na biblioteca do teu tio?
Agora é que Nicolas não percebia nada. Que brincadeira estúpida era aquela?

Como o autor, Paul Grote, explica, no fim do livro, durante as suas pesquisas, deslocou-se a Portugal, entrando em contacto com muitos vinicultores da região do Douro, que lhe deram as informações de que precisava. A obra está, de facto, bem fundamentada. Admira-me que ainda nenhuma editora portuguesa se tenha interessado por ela.


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