Em todos os momentos da História, seja na Antiguidade, na Idade Média, ou no nosso tempo, são as mesmas paixões e os mesmos desígnios que inspiram os humanos. Entender a História é entender melhor a natureza humana.

17 de janeiro de 2013

Mais uma questão de perspetiva


A preocupação por animais maltratados e abandonados e a sua consequente ajuda, por parte de pessoas que se compadecem deles, em tempos de crise, dá azo a inúmeras críticas por parte de quem não está sensibilizado para a questão animal. Então, o ser humano não está à frente de cães e gatos? Como se podem fazer campanhas a fim de pagar tratamentos hospitalares a um cão, quando há gente a passar fome?

Por outro lado, eu pergunto: o facto de haver gente a passar fome justifica o gesto de olhar para o lado, ao depararmos com um animal em grande sofrimento? Ajudarei alguém (pessoa, ou animal) com esse gesto? Alguém, no seu perfeito juízo, acredita que, se pararmos de tentar ajudar os animais, diminuirá a fome no mundo? O mesmo se aplica à angariação de dinheiro para, por exemplo, questões culturais.

A este propósito, costumo recordar-me de algo que se passou na sequência do desmoronamento do Bloco de Leste.

Quando a Roménia se revoltou contra o ditador Nicolae Ceauşescu e sua esposa, ditando a sua execução sumária, descobriu-se, naquele país, algo que arrepiou o resto da Europa. Durante décadas, o regime comunista romeno livrou-se de seres incómodos, note-se, crianças com deficiência, depositando-as nos chamados Spital, onde ficavam fechadas, longe dos olhares dos humanos "normais", até dos seus próprios progenitores, que tinham mais que fazer do que preocupar-se com filhos "anormais"! Caído o regime, o ocidente deparou com imagens horríveis desses inocentes, que vegetavam em instituições inenarráveis, sem o mínimo de higiene, nem cuidados, num sofrimento atroz.

A barbaridade gerou, e muito bem, uma grande onda de solidariedade. Organizações como a Cruz Vermelha e os Médicos Sem Fronteiras canalizaram esforços e pessoal para irem tratar daquelas crianças. Os cidadãos europeus fizeram enormes donativos em dinheiro, comida, brinquedos e medicamentos.

A alguém passava pela cabeça que houvesse quem contestasse tal movimento?
Acontece que a maioria da população romena vivia na miséria e muitos desses Spital ficavam nas imediações de aldeias onde se passava fome e frio. A chegada das carrinhas da Cruz Vermelha, cheias de alimentos e outros mimos para as ditas crianças, começaram a ser alvo de ataques dos aldeões. Atiravam pedras, pondo a vida dos voluntários em risco, e davam asas à sua fúria: como podem pensar em ajudar esses anormais, enquanto nós vivemos na miséria? Não valemos nós mais do que um punhado de anormaizinhos?

O problema não são os animais que vivem como pessoas. São as pessoas que vivem como animais.

Cada um tire as suas conclusões!

6 comentários:

nel disse...

Muito bem explorado e dá bem que pensar!

Cristina Torrão disse...

Obrigada, Nel.

Vespinha disse...

Excelente texto, Cristina.

Cristina Torrão disse...

Agradecida, Vespinha.

Anónimo disse...

Olá! Cristina. Tão certa na tua prespectiva. Infelizmente tanta pessoa vive abaixo do limiar da pobreza sem condição nenhuma e só se lembram de elas quando "fica bem" na "fotografia" e é tão triste. Amiga, desculpa ter fechado o blog da blogger sem nada dizer, mas fá-lo-ei a quem acho o devo e sem dúvida tu és uma delas. Parti um dedo da mão esquerda, escrevo claro,mas não é a mesma coisa. E aproveitei esta altura para fazer algo que já estava a pensar. Uma remodelação e quiçá fazer um novo aqui. Se me permites enviar-te-ei um mail a explicar melhor porque assim é complicado. Um beijinho e muito obrigado pela tua amizade. Pelo carinho e sem dúvida que és uma pessoa com quem não quero perder o contacto. Um grande abraço. Bom fsemana!

Cristina Torrão disse...

Rain, desejo-te as melhoras, espero que o dedo sare depressa. Para quem escreve tanto como tu (incrível, não sei onde vais arranjar tanta inspiração), deve ser duplamente incomodativo.
Bom fim-de-semana também para ti (dentro das possibilidades)!