Um
miúdo misterioso e solitário, do qual se desconhece o pai, nem a própria mãe
faz ideia de quem seja; um músico que deixou de tocar o seu violino, por um
acidente lhe ter levado o amor da sua vida; um vendedor de imóveis que olha
apenas para os próprios sapatos; um agente da autoridade cooperador com os
arranjinhos e a corrupção local; uma aldeia que é o microcosmos do nosso país. São
estes os pontos de partida que João J. A. Madeira escolheu para desenvolver o
seu romance melancólico, trágico mesmo.
As
pessoas são desconfiadas, por natureza, receiam o desconhecido, em suma, tudo o
que lhes parece estranho, não hesitando em inventar explicações abusivas para
certos fenómenos, que se transformam em verdades absolutas e que podem pôr
existências em perigo. A aldeia que serve de palco a este enredo encerra em si
mesma a miséria e a falta de perspetivas causadas pela crise atual, mas também
os vícios da sociedade portuguesa, na sua mesquinhez, na sua aptidão para a
solução fácil, o jogo de interesses e o pequeno delito, ao qual todos fecham os
olhos, porque, enfim, temos de nos ajudar uns aos outros. E muitas pessoas, não
obstante o seu bom coração, escondem algo no seu íntimo, pelo qual se
envergonham, incapazes de o confessar. Algumas adotam comportamentos excêntricos,
que nem elas próprias sabem explicar. E o único remédio parece ser a morte, que
tudo acaba e tudo resolve…
Será?
«Estranhamente
não leva os olhos ao céu que vislumbra através da abertura da porta. Lá não acontece
nada. É ali, em baixo, na terra que ela pisa e que se gruda a uma bola redonda
que os mistérios acontecem. Mas, resolvidos uns, outros acontecerão. Até quando?».
(p. 301)
No
meio da melancolia e da tragédia, há sempre uma réstia de esperança. Porque,
afinal, o amor é sempre possível, mesmo para quem já desistiu dele (ou pensa
ter desistido). E assim se cria um pequeno foco de felicidade, num romance sem
final feliz.
Mais um livro de João J. A. Madeira que vale a pena ler!
(Já aqui tinha falado de O Rio que corre na Calçada)
Interessante!
ResponderEliminarRecordo-me da minha mãe falar nesse "Caga Tacos".
:)
Beijinho!
Vale a pena ler sim senhora! Uma história simples, bem contada, bem escrita e que prende a atenção até ao revelante final.
ResponderEliminarOlha, Iceman, por acaso, eu não conhecia a expressão. Ao ler este livro, aprendi que é uma alcunha utilizada em certas regiões do país.
ResponderEliminarBeijinho :)