Excertos de uma entrevista dada pelo sociólogo norte-americano Philip Gorski, Professor na Universidade de Yale, à edição de 11 de outubro de 2020 do Jornal Católico da diocese alemã de Hildesheim, em que se analisa o apoio incondicional dado a Trump pelos evangélicos norte-americanos:
Qual a razão de muitos evangélicos serem apoiantes incondicionais de Trump?
Para eles, o essencial é a proibição do aborto e do casamento entre homossexuais. Até podem criticar a política migrante de Trump, ou não aprovar o comportamento pessoal do Presidente - no fim, tudo isto é secundário. Aqueles dois temas estão acima de quaisquer outros.
Porque consideram eles esses temas tão mais importantes do que outros temas cristãos, como a justiça social, o clima, ou a proteção dos refugiados?
Isso explica-se, em parte, do ponto de vista psicológico. Muitos temas políticos permanecem abstratos para certos conservadores norte-americanos, como impostos, alianças internacionais ou proteção do ambiente. Têm dificuldades em estabelecer uma relação com questões desse tipo. Já no que concerne ao aborto ou ao casamento homossexual, estabelecem, de imediato, uma ligação emocional, porque veem aí uma ameaça aos seus valores familiares tradicionais. O casamento monogâmico e heterossexual é, para eles, muito central - pretendem manter a sociedade limpa de todos os comportamentos que não se coadunem com estes seus valores. Os Republicanos vêm propagando a ameaça a estes valores familiares nos últimos anos, a fim de espetar uma cunha entre os conservadores católicos e o Partido Democrata.
Como se explica que especialmente os evangélicos brancos se sintam ameaçados?
Para eles, os Estados Unidos da América são uma nação branca e cristã, fundada por Protestantes brancos e prósperos. Sentem esta identidade ameaçada pela secularização, pela imigração e pelos não-cristãos. Sentem-se realmente como o grupo mais ameaçado e perseguido dos EUA. E consideram necessitar de um protetor forte e impiedoso, que os defenda a todo o custo.
E esse protetor é Trump?
Exatamente. Muitos acreditam mesmo que Trump é um enviado de Deus, um instrumento de Deus. Trump é, para eles, um Messias. Comparam-no ao rei Ciro do Velho Testamento, que libertou os israelitas do cativeiro babilónico. Muitos evangélicos leva a Bíblia à letra e estabelecem permanentemente paralelos entre a política atual e o Apocalipse. Consideram estar no meio de uma luta entre o Bem e o Mal. Eles, os evangélicos, estão naturalmente do lado do Bem - os seus opositores políticos e culturais corporizam o Mal.
E Trump sustenta essa sua crença?
Sim, Ele vê o mundo tal como eles: divide-o entre amigo e inimigo, Mal e Bem. O seu princípio é olho por olho, dente por dente (…) Ficaria surpreendido se me dissessem que ele, em toda a sua vida, tivesse mais de uma hora de leitura da Bíblia. Mas, como todos os demagogos, ele possui grande capacidade de sentir como o público reage à sua pessoa e de escolher os temas que provocam a reação mais forte.
Quão importante é para os eleitores cristãos a manutenção da democracia?
Não tão importante como se possa pensar. Sobretudo os brancos evangélicos e muitos católicos conservadores vão tomando uma direção cada vez mais autoritária. Eles consideram inclusive a democracia ser um obstáculo que os impede de alcançar os seus fins políticos. Muitos dizem abertamente desejarem uma ditadura.