Vai-se quebrando um dos grandes tabus do futebol masculino. Muita gente com tendências homofóbicas pode perguntar-se se é necessária tanta ostentação. Desdenha com frases feitas, do género: “Que façam o que quiserem à porta fechada, mas não o exibam em público”. Palavras destas revelam grande cinismo. Por um lado, é óbvio que pares como o da foto não estão a fazer aquilo que possam fazer em privado. Por outro, é uma declaração de apoio à discriminação, na medida em que se assume haver seres humanos não dignos de um convívio social sadio e se devem esconder. E, por fim, muitas dessas pessoas deliram com declarações de amor ou propostas de casamento públicas entre um homem e uma mulher (incluindo a hipocrisia de certos homens casados ou comprometidos, que, depois de exultarem com cenas dessas, apoiando a família tradicional, se dirigem ao bordel mais próximo).
Ignoram a verdadeira mensagem de gestos desta natureza: a luta pela inclusão social. Não é fácil esconder de todos uma parte importante da nossa vida. Há festas, convívios, reuniões de família, onde homens e mulheres surgem com os seus parceiros e parceiras, conversam, riem, divertem-se. Um homossexual que ainda não se tenha revelado como tal nunca se pode divertir, nessas situações. Passa o tempo a fingir, a esconder, a tentar responder de maneira mais ou menos adequada a perguntas como: “outra vez sozinho?”; “quando arranjas namorada?”; “já é tempo de constituíres família”. Por vezes, apresentam-lhes mulheres solteiras, com um olhar que encerra a obrigatoriedade de ir para a cama com ela. E o homossexual tenta superar, tão bem quanto possa, o desgosto de, afinal, ter namorado, mas ter de prescindir dele, em momentos importantes da sua vida. A isto acrescem-se olhares e sorrisinhos a insinuar: “há algo de errado com ele”; “deve ser bicha”; “coitado”.
É muito difícil viver sob carga psicológica tão negativa. Muitos homossexuais e lésbicas deixam-se mesmo arrastar para a marginalidade, com todas as consequências nefastas que isso acarreta. E, no entanto, apenas desejam ser aceites, como qualquer outra pessoa. É disso que se trata, não de exibicionismo ou imposição de formas de vida que não cabem nos esquemas sociais transmitidos. São seres humanos à procura da estima dos seus semelhantes. Há séculos. Melhor dizendo, há milénios.
É interessante verificar que a homossexualidade é aceite no futebol feminino. Na verdade, muita gente considera as jogadoras serem todas lésbicas, o que está longe de ser verdade. Mas não menosprezemos, com isso, o papel fundamental das lésbicas na emancipação feminina. Elas estiveram presentes, desde o início, foram importantes impulsionadoras das suffragettes e de outros movimentos. Também na aceitação de muitas modalidades desportivas no feminino. Não se sentindo dependentes de homens, possuíam amiúde mais coragem para lutar. E encorajaram muitas outras mulheres a fazerem-no, lutaram em nome de todas. Também em meu nome. Agradeço-lhes.