No início de Agosto, Mariana Patrocínio publicou, na sua conta do Instagram, esta fotografia com sua mãe e quatro das suas irmãs. Uma seguidora comentou “genética maravilhosa”. E eu atrevo-me a discordar. Melhor falando, penso que a genética apenas contribui com 20% a 30% para resultados destes. O resto é berço e disciplina nas práticas alimentares e de exercício. No caso desta família, o berço inclui aliás dinheiro q.b. para gastar em ginásios e institutos de beleza. Não menciono, porém, a questão monetária com cinismo. Quem nasce em ambiente propício, faz muito bem em aproveitá-lo. Eu faria o mesmo. Berço, no entanto, é bem mais do que notas e cartões de crédito.
O cerne da questão é a genética estar muito sobrevalorizada. A silhueta das beldades da foto está ao alcance da grande maioria das mulheres. Para adquirir boas práticas de alimentação e exercício físico, o berço pode ser de classe média, ou até pobre. Mas cumpre um papel importantíssimo. Alcançar, na idade adulta, figuras deste tipo, é quase impossível para quem cresceu num ambiente de obesidades e más práticas alimentares.
Muita gente não acredita, mas criar crianças obesas é estragar-lhes o futuro. E uma família não precisa de ser rica para comer com discernimento e incentivar a actividade física. Uma alimentação equilibrada também não significa dietas, não há alimentos proibidos. Mas é preciso saber quando comer o quê e em que quantidades. Talvez seja bom acabar com o hábito de dizer às crianças “come lá mais uma fatia de bolo” ou “então não acabas a carninha”, quando elas dão sinais de já estarem satisfeitas. Parece que não, mas é muito importante aprender a interpretar os sinais do corpo. Muitas vezes, continuamos a comer, apesar de já estarmos cheios até à goela.
Actividade física também não implica ginásios caros, podem-se inscrever as crianças num clube desportivo acessível à família, seja de futebol, voleibol e outros “ois”, ginástica, natação, patinagem, dança, skate, ciclismo, etc. Mas é igualmente importantíssimo dar o exemplo em casa, fazendo, quanto mais não seja, caminhadas regulares com os pimpolhos. Pode-se aproveitar o caminho para a escola, ou mesmo a ida ao café. Se o café for perto é até aconselhável fazer um desvio generoso. E quem alegue não ter tempo para passeios durante a semana, pode fazê-los ao fim-de-semana. Uma hora de caminhada faz milagres em todos, pais e filhos. E, quem chega a adulto habituado a estas andanças, normalmente, continua a praticá-las.
A genética está igualmente sobrevalorizada noutros campos, como o artístico, ou o intelectual. O ambiente e os hábitos conhecidos desde o berço são muito mais importantes. Filhos de escritores habituam-se, desde sempre, a hábitos e conversas de e sobre os livros e escrita, incluindo as visitas e amigos dos pais. Filhas de atrizes crescem no meio dos cenários, das câmaras, dos holofotes, dos gritos de “acção”, do decorar dos papéis e também os frequentadores da casa familiar pertencem maioritariamente a este meio. O mesmo acontece com músicos, cantoras, pintores, cientistas, jornalistas, etc. Porém, mesmo quem não pertença a mundos destes, pode transmitir aos filhos o interesse pela cultura, interessando-se ele próprio. Quem não é incentivado, na infância, também pode lá chegar, mas é bastante raro.
Por isso, quando se quer elogiar uma pessoa elegante, considero mais adequado dizer “bons hábitos” do que “bons genes”. Também é mais lisonjeador, pois, na verdade, em nada contribuímos para ter os genes que temos. Já elogiar-nos os hábitos é elogiar o que é da nossa responsabilidade.
Não estou a dizer que a genética não contribui. O mais importante, contudo, é como aprendemos a estar no mundo. E, na infância, vemos o mundo através dos olhos dos nossos pais.