O infante D. Afonso estava casado com uma parente próxima, pelo que necessitava de uma dispensa papal, que não chegou a receber. Pediu, por isso, ao irmão rei que lhe legitimasse os filhos, para que estes pudessem herdar os seus bens. Apesar do protesto de D. Isabel, D. Dinis fez a vontade ao irmão.
Esta antipatia da rainha, normalmente generosa e paciente, estranhou D. Dinis:
Dinis notava como Isabel tinha dificuldades em disfarçar a antipatia que sentia pelo infante. Como se tratava de algo extremamente raro nela, já a averiguara nesse sentido, pelo que ela o informara que Afonso representava tudo aquilo o que ela abominava: falsidade, inveja, irresponsabilidade e inconveniência. O rei espantara-se com a brusquidão daquela resposta, mas só num primeiro momento. Isabel era mesmo assim: sincera, no bem e no mal.
Mais tarde, porém, D. Isabel arrepende-se:
Regressado a Lisboa em Setembro, o rei encontrou Isabel preocupada. Por um lado, o estado de saúde da sogra inspirava cada vez mais cuidados e, por outro, ouviam-se rumores quanto a manobras de Afonso:
- Diz-se que ele jamais tornará a fazer as pazes convosco, que só descansará quando se apoderar ele próprio do trono.
- E porque vos afligis tanto? Acreditais que ele me consiga derrubar?
- Não, mas pressinto uma guerra, o verter desnecessário de sangue… Além disso, preocupo-me com ele...
Dinis arqueou as sobrancelhas espantado:
- Vós preocupais-vos com o vosso cunhado?
- Na Primavera, quando recebestes o pedido de auxílio dos concelhos leoneses, ele reagiu de forma muito estranha: aqueles ataques de fúria despropositados, a crença de que todos o abandonaram, até a própria mãe…
O rei encolheu os ombros:
- Ele sempre foi de birras.
- Pressinto algo mais grave… E censuro-me por o ter desprezado.
- Que dizeis?
Visivelmente incomodada, Isabel confessou:
- Não sei porque o fiz. Afinal, empenho-me em ajudar e em compreender os outros, por mais defeitos que tenham. Mas Afonso… - suspirou, agitada. - Ele sempre teve uma habilidade incrível para me repugnar. E censuro-me por não ter conseguido vencer essa aversão. Não me consigo livrar da convicção que, se tivesse sido mais compreensiva e procurado uma aproximação, talvez ele não se sentisse tão abandonado pela família e não tivesse tanta necessidade de vos afrontar… e de magoar a mãe.
- Não vos martirizeis! Afonso, no fundo, nunca se conformou com a sua condição de filho segundo. Desconfio que, mesmo quando acompanha a corte e encabeça a lista dos confirmantes, remói o seu desagrado, a sua frustração… Enfim, é uma condição maldita…
- Mais uma razão para sermos compreensivos com ele.
- Mas eu sempre o fui! Sempre me esforcei por cumprir o desejo de meu pai, que tomasse conta dele, que o amparasse… - Abriu os braços, num gesto de impotência: - O que eu não posso é pôr-lhe o trono à disposição!
O infante D. Afonso terá passado os seus últimos anos de vida muito amargurado, recolhido na sua vila de Vide, afastado de tudo e de todos, morrendo com apenas 48 anos. Mas não vou revelar aqui as razões, há-de haver motivos para que comprem o livro!
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Surpreendente este relato de D. Isabel. As mulheres sempre tiveram um apertado sentido de alcova, de protecção dos seus. Uma menor tolerância ao risco...
ResponderEliminarPouco se sabe da sua relação com o cunhado, é um aspecto que não entra nas crónicas medievais. Mas a verdade é que ela protestou acirrada contra a legitimação dos sobrinhos, a declaração de protesto chegou aos dias de hoje. Um acto radical, anormal na sua vida...
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