Em todos os momentos da História, seja na Antiguidade, na Idade Média, ou no nosso tempo, são as mesmas paixões e os mesmos desígnios que inspiram os humanos. Entender a História é entender melhor a natureza humana.

19 de maio de 2015

Os Segredos de Jacinta - Excertos (23)



Os mouros provaram não tencionar desistir. Martim Moniz e o seu grupo conseguiram forçar a abertura da porta, mas os sarracenos adiantaram-se, saindo e provocando grande matança entre os cavaleiros portugueses. Martim Moniz tentou impedir que fechassem novamente os portões e acabou por morrer esmagado.
O ataque deixou feridos a agonizar na encosta da alcáçova e, embora já houvesse gente a tratar deles, o irmão Ambrósio rogou a Jacinta que fosse em seu auxílio, pois mais ninguém curava como ela.
Seguiu o monge até ao local, apesar de fatigada, com as madeixas a soltarem-se-lhe da trança, acossadas pelo vento forte. Movia-se entre os mortos e feridos dando as suas ordens, de sentimentos fechados, constatando haver poucos guerreiros a quem acudir, pelo que se despacharia lesta. Não lhe parecia, aliás, haver tarefas que exigissem a sua intervenção e censurou interiormente o irmão Ambrósio, que a arrastara até ali sem necessidade.
Antes de volver ao acampamento, deu mais uma volta, por descarga de consciência. Perto do cemitério islâmico, ouviu alguém berrar. Virou-se e viu um guerreiro que ainda não estava a ser assistido e que se tentava arrastar. Gritou-lhe:
- Deixai-vos estar! Vou a caminho!
O homem rebolou, ficando deitado de costas. Jacinta viu-lhe a barriga ensanguentada. Mas viu algo mais que a fez sentir-se como se lhe tivessem igualmente furado as entranhas. Ao rebolar, o cavaleiro perdera o capelo de ferro e o cabelo escapava-se-lhe do almofre, agitando-se ao vento. Cabelo de um castanho inconfundível!


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