Jacinta não sabia o que pensar. Tornou a
agradecer ao irmão Ambrósio, mas não conseguia partilhar da sua euforia. Duvidava
que el-rei e o arcebispo se lembrassem dela, uma mulher, depois de terminado o
pesadelo. E quiçá D. João Peculiar houvesse exagerado nas suas afirmações, a
fim de agradar ao monge. Ou o próprio irmão Ambrósio, no seu entusiasmo,
houvesse visto aceitação e admiração a mais nas atitudes dele.
Tornou a concentrar-se no seu labor,
estava ainda longe de poder repousar. E o seu ceticismo em relação ao ataque do
dia seguinte provou não ser infundado. Se bem que houvesse um pequeno avanço, o
desfecho foi, mais uma vez, catastrófico. Os ingleses conseguiram evitar que a
torre pegasse fogo e, dotado de um novo sistema de rodízios, o engenho não
ficou atolado na areia. Os mouros, porém, atreveram-se a uma surtida, por um
dos postigos virados ao rio, e dera-se novo massacre, na areia, que se empapara com o sangue dos
corpos.
Os combates só foram retomados dois dias mais
tarde, quando finalmente se deu a viragem. Os ingleses chegaram às muralhas com
a torre. E, antes que pudessem usar o passadiço que lhes permitiria alcançar o
adarve, os sarracenos depuseram as armas. Anunciaram que desejavam negociar
tréguas, mas apenas com el-rei de Portugal!
Aos cruzados não agradava que D. Afonso
Henriques negociasse sozinho com o alcaide, sendo de opinião que os portugueses
pouco contributo haviam dado para o sucesso do cerco. Seguiu-se uma série de
contratempos e insubordinações e, na noite de 22 para 23 de outubro, um grupo
penetrou traiçoeiramente na cidade, buscando um tesouro que se dizia escondido pelos mouros.
- Os cruzados ainda deitam tudo a perder –
lamentou o irmão Ambrósio, – quando julgávamos haver o pesadelo chegado ao fim!
D. Afonso Henriques acabou por controlar a
situação, garantindo a subjugação dos estrangeiros, mas a busca do tesouro, que
não existia, resultara em mais cadáveres pelas ruas da cidade, incluindo
mulheres e crianças. Também o velho bispo moçárabe foi encontrado no meio de
uma poça de sangue, de goela cortada.
Bom dia, Cristina Torrão. Episódio semelhante relatado o vosso livro Afonso Henriques O Homem.
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ResponderEliminarExcerto que nos dá a ideia dos interesses em presença e dos que foram morrendo naquele contexto e que a História muitas vezes silencia.
Bj
Olinda