Em todos os momentos da História, seja na Antiguidade, na Idade Média, ou no nosso tempo, são as mesmas paixões e os mesmos desígnios que inspiram os humanos. Entender a História é entender melhor a natureza humana.

30 de julho de 2015

Sinais de separação


O psicólogo e conselheiro conjugal americano John Gottman tem vindo a estudar, desde há quarenta anos, o comportamento de casais, à procura de sinais que possam indiciar uma separação futura. Desenvolveu um método que, segundo ele, tem mais de 90% de probabilidades de acertar se um casal se irá separar ao fim de quatro a seis anos de casamento. A experiência que acumulou permite-lhe fazer uma previsão, depois de observar um vídeo de cerca de 15 minutos, que mostre cenas em que o casal discuta.

O que parece uma tolice tem a sua razão de ser, torna-se credível, depois de tomarmos conhecimento do seu método. John Gottman diz que é indiferente saber sobre o que o casal discute, importante é analisar o seu comportamento, que capacidade os dois possuem de entender e levar a sério problemas alheios e se há realmente sentimentos positivos entre eles.

O psicólogo aponta concretamente quatro tipos de comportamento de alto risco, a que ele chama «os quatro cavaleiros do apocalipse»:

- Crítica baseada na humilhação e no insulto
- Comportamentos defensivos ou de rejeição, como o típico gesto de desprezo com a mão, o rolar dos olhos, ou vitimizar-se
- Falta de respeito mútuo
- Amuar, deixando de comunicar com o/a parceiro/a durante dias

John Gottman garante que estes quatro tipos de comportamento dão cabo de qualquer relação e propõe soluções.

Pois, já diz o povo: «o respeitinho é muito bonito». E não se esqueçam de que só quem se respeita é capaz de respeitar os outros!

Nota 1: escrevi este post baseada num breve artigo alemão. Mais sobre o tema em The Gottman Institute.

Nota 2: John Gottman escreveu igualmente sobre a arte de educar os filhos, no seu livro Inteligência Emocional. Pode tomar contacto com o tema neste site (em português) ou em The Gottman Institute.


28 de julho de 2015

Guédelon – Construção de um castelo medieval



O Canal televisivo ARTE mostrou, no passado dia 20 de Junho, o documentário Renaissance d’un château medieval, sobre a construção de um castelo, na Borgonha. Este ambicioso projeto, iniciado há quase 20 anos, tem por objetivo pôr de pé uma fortaleza, usando apenas técnicas do século XIII.


A fotografia acima mostra o aspeto geral da obra, já se vendo a casa de residência dos senhores do castelo, uma das torres em estado bastante adiantado e o esboço das muralhas. Foi isto que se conseguiu desde 1997, ressalvando que as obras são interrompidas durante todo o Inverno, devido à lama que se cria, e não se usam guindastes, instrumentos, materiais ou técnicas posteriores ao século XIII (incluindo de desenho, medição, planeamento e transporte das pedras).


O documentário evidenciou bem as dificuldades encontradas pela equipa responsável por esta construção. Impressionaram-me particularmente os festejos e o alívio dos envolvidos ao conseguirem acabar a janela da capela (na foto), tão difícil foi a sua concretização, devido aos arcos. E perguntamo-nos como foi possível construir as catedrais góticas…



Admiro muito as pessoas que se dedicam a projetos destes, pela sua perseverança, mas também pelo respeito que votam ao passado, no meu entender, a única maneira de apreciar, em pleno, e entender melhor o presente.


O castelo de Guédelon está aberto a visitantes durante a época de férias. Para mais informações, consultem o site oficial, aqui em língua francesa, e em língua inglesa.


Podem ver aqui o vídeo do documentário (em francês). Todas as fotografias usadas neste post têm a mesma origem.


27 de julho de 2015

A Citação da Semana (71)

«Toda a gente consegue criar empatia com um amigo que sofre. Mas é preciso possuir um grande carácter para se alegrar com o sucesso de um amigo».

Oscar Wilde




23 de julho de 2015

A filha de Jairo


Todos já ouvimos a história de como Jesus fez ressuscitar uma menina de doze anos. Era filha de Jairo, o chefe de uma sinagoga. Jairo foi ter com Jesus, muito aflito:

«A minha filha está morrer. Vem e põe as mãos sobre ela para que fique curada e possa viver».
Mc 5, 23

Quando chegaram a casa de Jairo, deram com toda a gente a lamentar e a chorar, pois a menina já teria morrido. Mas Jesus disse:

«Que agitação e gritaria é esta? A menina não está morta, está a dormir».
Mc 5, 39

Depois:

«Pegou-lhe na mão e disse: «Talita kum», que quer dizer: «Levanta-te menina! Sou eu que te digo!» E a menina, que tinha doze anos, levantou-se imediatamente e começou a andar. Todos ficaram muito impressionados. Então Jesus ordenou-lhes que não contassem nada a ninguém e disse-lhes para darem de comer à menina».
Mc 5, 41-43

Deparei com este episódio ao ler o jornal católico do bispado de Hildesheim, que recebo regularmente. E pus-me a meditar em certos pormenores. Em primeiro lugar, não se menciona, uma única vez, o nome da menina. Ela é sempre «a filha de Jairo». Naquele tempo, as meninas e as mulheres eram muito subjugadas, à semelhança do que ainda hoje acontece em certos estados islâmicos (recordemos o apedrejar da adúltera). Sentir-se-ia esta menina tão oprimida, tão perturbada psicologicamente, que tivesse desistido de viver? Teria perdido a força, a motivação, quiçá, deixado de comer? A anorexia não terá surgido apenas no nosso tempo... Recusaria ela a comida, emagrecendo quase até à morte, sem ninguém perceber porquê? Foi quando a última frase desta história me saltou aos olhos: «Jesus disse-lhes para darem de comer à menina»!

Tudo parecia encaixar. O facto de Jesus lhe ter segurado na mão e se ter dirigido a ela, só a ela, podia ter-lhe transmitido a confiança necessária para que ela saísse da letargia em que se encontrava, recuperando a vontade de viver. Todos nós sabemos que Jesus devia transmitir uma confiança e uma segurança incríveis. E o tocar numa mão com carinho, a quem não está habituado, o considerar pobres diabos como pessoas de plenos direitos… Tudo coisas que podem, de facto, operar milagres.

Depois destas cogitações, tornei a pousar os olhos no jornal. Normalmente, a seguir a uma passagem do Evangelho, há um comentário de uma/a colaborador/a, normalmente, sugerindo o que podemos aproveitar do episódio para a nossa vida.

Mal pude acreditar no que lia! Emocionei-me. Não será por acaso que, desta vez, o comentário foi escrito por uma mulher. E não resisto a traduzir as impressionantes palavras da jornalista Andrea Schwarz:

Eu sou a filha de Jairo. Não tenho nome, sou um nada, não sou ninguém, sou apenas a filha de…
Assim, não posso ser uma pessoa, não me posso tornar mulher. Assim, não posso crescer, evoluir, seguir o meu caminho. Enquanto o meu pai me mantiver, sou apenas filha – e não posso tornar-me mulher. O amor do meu pai mantém-me presa, de mãos atadas.

Lutei muito – e perdi. Agora, desisto.

Se não posso tornar-me mulher, também não quero continuar a ser filha. A minha energia esvai-se, recolhe-se. E morro todos os dias um bocadinho – porque não me deixam viver.

Mas, no fundo do meu ser, a vida ainda espera. Espera que chegue alguém que me toque e reconheça o que tenho dentro de mim. Espero por alguém que me chame. E, um dia, esse alguém chegará… Sei-o.

Até lá, escondo-me. À minha volta, cresce uma sebe de espinhos, que me protege. Para os outros, estou morta. Mas apenas durmo.

Quando ele chegou, pôs a mão dele sobre a minha. Olhou-me – e viu-me! Ele viu quem se quer tornar mulher. E disse: «menina», não «filha de…». Ele referiu-se a mim.

E disse: «Levanta-te!» - Segue o teu caminho, como pessoa, como mulher!

Encarada, tocada, reconhecida, amada, salva, liberta.

Foi quando os espinhos se transformaram em rosas.

E eu levantei-me e fiz-me ao caminho – e pude viver, finalmente viver.



Edição da KirchenZeitung nº 26, de 28-06-2015


21 de julho de 2015

Sultão - O Burreco que veio de Miranda




Pardinho, Pernas, Orelhas, Ruço, Sultão – cinco nomes para o mesmo burro, conforme os seus donos, adaptando-se às funções que desempenha: animal de carga, meio de locomoção para o pastor com deficiência nas pernas, companheiro de brincadeiras, consolo na solidão, burro de passeio, ou mesmo animal com capacidades terapêuticas para doenças da alma e do corpo. Também poderiam ser diferentes burrecos, subestimados ao longo dos tempos, mas sempre fiéis aos humanos, seja quais forem as condições de vida. Até para um Contador de Histórias, que pretende «promover e desenvolver o gosto pela leitura», o burro é imprescindível, nas incursões pelo Planalto Mirandês, desta vez, com o nome de Atenor, tendo livros como carga nos seus alforges.

Isabel Maria Fidalgo Mateus presenteia-nos com mais uma excelente novela, na qual retrata a vida transmontana como ninguém, de um passado recente até à atualidade, vida impossível de imaginar sem a ajuda e a companhia de animais, dando a estes a dignidade que tantas vezes faltou e continua a faltar.

A modificação nas condições de vida conduziu à procura de novas funções que justificassem a existência destes animais e garantissem o seu bem-estar e é nesta linha que se desenvolve o trabalho da AEPGA – Associação para o Estudo e Protecção do Gado Asinino. 

O lançamento de Sultão – o Burreco que veio de Miranda, com ilustrações de Cristina Borges Rocha, foi incluído no programa do festival itinerante L Burro I L Gueiteiro (O Burro e o Gaiteiro, em mirandês), organizado pela AEPGA. No próximo sábado, 25 de Julho, o festival assentará arraiais na Aldeia de Vila Chã da Braciosa, perto de Miranda do Douro. Com diversas atividades, que incluem passeio, piquenique e várias oficinas (consultar programa aqui), terá lugar, às 18h 30m, o lançamento e leitura encenada por Bruno Lopes de alguns textos do Sultão.

Aproveito para dizer que todo o programa do festival itinerante L Burro I L Gueiteiro é ideal para uns dias de férias diferentes. Terá lugar de 22 a 26 de Julho e surge como um esforço de revitalizar e valorizar dois elementos chave da cultura mirandesa: o Burro de Miranda e o tocador de Gaita-de-Fole, em cinco dias de itinerância pelas aldeias da região, levando burros, gaiteiros, teatro, dança e música ao encontro das populações locais. Usando as palavras dos organizadores, trata-se de um evento a pensar em todos, miúdos e graúdos. A AEPGA também tem página no Facebook.

   
Para mais informações sobre a escritora Isabel Maria Fidalgo Mateus, de quem já tinha falado a propósito do seu lindíssimo livro Farrusco – Um Cão de Gado Transmontano, e que tem um dos seus livros, O Trigo dos Pardais, incluído no Plano Nacional de Leitura, visitem o seu site - http://www.isabelmateus.com/main.php, ou o seu mural no Facebook.