Em todos os momentos da História, seja na Antiguidade, na Idade Média, ou no nosso tempo, são as mesmas paixões e os mesmos desígnios que inspiram os humanos. Entender a História é entender melhor a natureza humana.

1 de março de 2025

Um ano com D. Dinis (11)

 FORAL DE ALFAIATES

 

 

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A 1 de Março de 1297, D. Dinis concedeu foral a Alfaiates, freguesia do concelho do Sabugal, embora esta localidade leonesa só tivesse sido oficialmente integrada em Portugal no Tratado de Alcañices, a 12 de Setembro desse mesmo ano.

 

28 de fevereiro de 2025

Um ano com D. Dinis (10)

 INFANTA D. BRANCA DE PORTUGAL

 

Faz hoje 766 anos que nasceu a Infanta D. Branca de Portugal, a irmã mais velha de D. Dinis, primeira filha de seus pais D. Afonso III e D. Beatriz de Castela. Recebeu o nome da tia-avó paterna, Branca de Castela, regente em França durante a menoridade do filho Luís IX. Esta rainha acolhera o sobrinho Afonso (futuro Afonso III), na corte francesa.

D. Branca recebeu de seu avô Afonso X de Leão e Castela a herança de 100 000 marcos, que lhe deveria servir de dote. Porém, a infanta teve uma doença grave, pouco depois da morte do avô, prometendo dedicar a sua vida ao mosteiro de Las Huelgas de Burgos, caso sobrevivesse. Assim aconteceu e D. Branca usou o dote na reconstrução do mosteiro.

 

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Codex Manesse

Apesar de ter vivido longe de Portugal, a infanta manteve o contacto com o irmão Dinis, auxiliando-o em várias situações, nomeadamente, servindo de mediadora entre o rei e o irmão mais novo, nas revoltas que este levou a cabo.

Branca não professou, mas ficou conhecida como uma das maiores benfeitoras do mosteiro de Las Huelgas de Burgos e foi lá sepultada. Apesar de não ter casado, terá tido uma relação amorosa com o mestre carpinteiro responsável pelas obras do mosteiro, tendo dado um filho à luz, que foi incluído na nobreza castelhana (um episódio não esclarecido).

A infanta D. Branca morreu a 17 de abril de 1321. A sua sepultura pode ser visitada no referido mosteiro.

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Lancastermerrin88, CC BY-SA 4.0

 

 

27 de fevereiro de 2025

Um ano com D. Dinis (9)

 FUNDAÇÃO DO MOSTEIRO DE ODIVELAS

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Imagem Câmara Municipal de Odivelas

 

Faz hoje 730 anos que D. Dinis fundou o Mosteiro feminino cisterciense de Odivelas.

A 27 de fevereiro de 1295, deu-se lugar à cerimónia do lançamento da primeira pedra do mosteiro de São Dinis, em Odivelas, uma planície atravessada por um riacho e entre três pequenos montes: Luz, Togais e São Dinis. Seria construído um imponente edifício, que abrigaria cerca de oitenta monjas pertencentes à Ordem de São Bernardo, tal como os frades de Alcobaça.

Dinis presidiu à cerimónia, juntamente com a rainha e os dois filhos, e doava ao mosteiro todos os bens que possuía em Odivelas: vinhas, pomares, hortos, moinhos e azenhas, além de uma capela, casas e edifícios, onde a comunidade viveria durante a construção do convento. Também lhe doava outros bens na Charneca, em Pombeiro, Xabregas e Alenquer, incluindo o padroado da igreja de Santo Estêvão daquela vila. E, abrindo uma exceção nas leis de desamortização que ele próprio promulgara, autorizava a nova instituição a herdar os bens de raiz das suas monjas.

No seu discurso, o monarca referiu que aquele mosteiro seria construído

especialmente em honra e louvor de São Dinis e de São Bernardo, pelas nossas almas e dos Reis que antes de nós foram, e em remissão dos nossos pecados e dos nossos sucessores, fundamos e fazemos de novo em a nossa câmara de morada, que nós havíamos no termo da nossa cidade de Lisboa, no lugar que é chamado de Odivelas.

(excerto do meu romance)

Conforme foi seu desejo, D. Dinis foi sepultado neste mosteiro. Há cerca de dez anos, foi chamada a atenção para o avançado estado de degradação em que se encontrava o túmulo. Criou-se a página do Facebook  Vamos salvar o túmulo do rei D. Dinis, iniciativa que deu frutos. Não só o túmulo foi restaurado, como foi possível fazer a reconstrução facial do Rei Lavrador. Estão programadas mais revelações sobre ele, ao longo deste ano.

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26 de fevereiro de 2025

Um ano com D. Dinis (8)

TRANSFERÊNCIA DO ESTUDO GERAL

 

Faz hoje 717 anos que o papa Clemente V autorizou a transferência do Estudo Geral para Coimbra, cerca de um ano depois de ter sido feito o pedido. O Estudo Geral das Ciências, percursor da Universidade, foi fundado em Lisboa, em Agosto de 1290, mas D. Dinis decidiu transferi-lo para Coimbra cerca de dezassete anos mais tarde.

Do meu romance:

           No início de 1306, Dinis reuniu-se com o arcebispo de Braga e o bispo de Coimbra, a fim de tratar de um assunto que não tolerava mais adiamentos: a transferência do Estudo Geral para Coimbra. A situação em Lisboa tornara-se insustentável, os escolares não mais haviam parado com os seus protestos e os conflitos iam-se agravando, afetando, não só grande parte da população, como os visitantes. Ao porto de Lisboa chegavam frequentemente galés estrangeiras e os estudantes, no seu descontentamento, abusavam da imunidade que Nicolau IV lhes concedera, envolvendo-se em toda a espécie de rixas.

            O Estudo, porém, teria de ser preservado, Dinis via a necessidade de formar especialistas portugueses, sobretudo em leis. Coimbra parecia ser a solução ideal, era bem mais sossegada e o rei planeava criar um burgo, adjacente à alcáçova, exclusivamente destinado aos estudantes. Além disso, o mosteiro dos Cónegos Regrantes de Santa Cruz, com a sua biblioteca, estaria em condições de lhes dar o mesmo apoio do de São Vicente de Fora, fundado por Afonso Henriques precisamente em homenagem ao de Santa Cruz de Coimbra.

            D. Estêvão Anes Bochardo, chanceler-mor do reino e bispo de Coimbra, regozijava-se com a transferência. A colaboração de D. Martinho Peres de Oliveira, arcebispo de Braga, era imprescindível, pois a medida teria de ser aprovada por Roma.

 

A Universidade haveria de trocar de local, sempre entre Lisboa e Coimbra, durante alguns séculos.

21 de fevereiro de 2025

Um ano com D. Dinis (7)

O SOLHO DESCOMUNAL

Faz hoje 704 anos que D. Dinis mandou elaborar uma ata curiosa, assinada por testemunhas de alta guisa e autenticada por um escrivão. Nela ficaram descritas as características de um solho descomunal pescado no Tejo, perto de Santarém.

Tal documento intriga os historiadores, perguntam-se em que circunstâncias terá ocorrido a sua elaboração. Sendo comummente aceite que D. Dinis era dado à vida boémia, criei uma cena alusiva, no meu romance sobre o Rei Lavrador.

 

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 Fonte da imagem

 

A cantiga acabou entre aplausos e gargalhadas estrondosas e os convivas reclamavam a sua repetição, quando um criado anunciou pretender D. Guedelha, rabi-mor do reino, falar com el-rei. Tinha um colosso de peixe para lhe mostrar. Dinis mandou-o entrar e D. Guedelha surgiu acompanhado por quatro serviçais carregando um solho descomunal acabado de retirar do Tejo.

- Assim que lhe pus os olhos em cima - afirmou o judeu, - disse para a minha gente: ala a mostrá-lo a el-rei, que nunca na sua vida viu tal.

- E é verdade - concordou Dinis. - Estais de parabéns, D. Guedelha. Pegai numa taça e bebei connosco.

Depois de se inclinar numa vénia, o rabi-mor agradeceu. Os fidalgos começaram a comentar as dimensões do colosso: na boca, caberia um raposo inteiro e, desde aí, até à cauda, contavam-se, no espinhaço, trinta escamas do tamanho de conchas. Constatou-se ainda que o peixe media dezassete palmos e meio de comprimento e sete de grossura. El-rei quis saber quanto pesava e sugeriu que se deslocassem à adega, onde se encontrava a balança.

- E vamos todos. Um colosso destes merece testemunhas de peso.

Os fidalgos, rindo da piada achada oportuna, levantaram-se, com as suas taças de vinho na mão. O alferes-mor João Afonso, que mal se aguentava em pé, ia ainda apossar-se de uma jarra, quando o cunhado de la Cerda lhe atirou:

- Homem, deixai aqui a jarra, que ainda a derramais pelas escadas abaixo.

As gargalhadas aumentaram ainda de tom às palavras do falcoeiro Afonso Fernandes de Baião:

- Onde já se viu? O homem tem medo de morrer à sede numa adega cheia de pipas.

Em passos trôpegos e no meio de grande algazarra, lá chegaram ao seu destino. Depois de se pesar o peixe, pasmaram: dezassete arrobas e meia, pelos pesos de Santarém.

Todos juravam nunca haver visto cousa assim e Dinis ordenou que o fenómeno ficasse registado. Mandou procurar um escrivão que estivesse sóbrio. E logo ali se elaborou uma acta, onde se registaram as medidas e o peso do solho, confirmadas pela assinatura de todos os presentes.

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Uma jovem de vinte anos, uma égua e uma viagem da Alemanha até Portugal (8)

BALANÇO

 

A 23 de Dezembro, três semanas e meia depois da sua chegada a casa, Jette fez um balanço da sua viagem. Ao organizar um livro de fotografias, recordou, passo a passo, as suas vivências e apercebeu-se, mais do que nunca, da singularidade da sua experiência.

Atravessou o rio Reno de ferry; amarrou a Pinou à porta de um supermercado; dormiu num estábulo; o pai levou-a através da França, para que ela pudesse retomar a viagem em Burgos; cavalgou ao longo do Atlântico; dormiu em casa de pessoas desconhecidas, incluindo homens acabados de conhecer, apenas porque eles a abordaram de maneira simpática e perguntaram: “queres dormir aqui?”. Porém, diz Jette, nunca sentiu receio, nem insegurança. Todas as pessoas se revelaram prontas a ajudá-la, com a melhor das intenções.

Jette notou igualmente a diferença que a viagem operou na Pinou. A égua dormiu em alguns sítios sozinha e/ou ao ar livre, assim como num estábulo com cavalos que lhe eram estranhos. As duas atravessaram florestas solitárias, Pinou chegou até a caminhar solta, à sua frente. A égua emagreceu um pouco, mas seria praticamente impossível evitá-lo, numa jornada tão longa. Mantendo-se em contacto com a dona, Jette sabe, entretanto, que a Pinou recuperou o seu peso normal e se encontra calma e feliz. A relação de completa confiança estabelecida entre ela e o animal, as pessoas incríveis que conheceu e as lindas paisagens foram, segundo a moça, as melhores vivências.

Ao folhear o livro de fotografias, Jette apercebe-se de como foi incrível elas não terem desistido. E conseguir regressar à Alemanha, sem levar a Pinou consigo. O facto de logo ter sido solicitada para tratar, montar e educar novos cavalos ajudou-a a diminuir as saudades da Pinou.

A moça agradece ainda o apoio dos pais, do namorado, de família, amigos e da dona da Pinou. Acompanharam o seu diário de viagem, comentaram, deram-lhe ânimo. As novas tecnologias têm muitos aspectos positivos, basta dar-lhes o uso adequado.

Jette diz que nunca se sentiu sozinha, durante a viagem, pois tinha a Pinou a seu lado. E eu penso ter sido precisamente isso a dar-lhe uma permanente sensação de segurança. Ela não fez a viagem de bicicleta, tinha um animal consigo, um ser vivo. Embora a Pinou pertença a uma raça relativamente pequena, um cavalo impõe sempre respeito. É o suficiente para afugentar quem nada entende de animais, ou cobardes. E sabemos: homens que molestam mulheres são cobardes. A não ser que estejam munidos de uma arma para, neste caso, dar cabo do animal. Mas isso, na nossa Europa, é felizmente raríssimo.

Neste postal, a comentadora Susana V. não deixou de referir ser imprudente “uma jovem de 20 anos com a responsabilidade enorme de tratar de uma égua, a viajar por terras despovoadas”, embora diga também que “as boas aventuras são muitas vezes comportamentos inconscientes que correram bem”.

Admiram-se sempre as aventuras dos rapazes, enumerando, com entusiasmo, os perigos por que passaram. Em relação a raparigas, somos mais críticos. Há mais perigos à sua espreita. E duvida-se mais facilmente das suas capacidades (neste caso, em tratar de uma égua). Mas a Jette provou que não tem de ser assim.

E não, não pretendo igualar os sexos, mas o respeito e a consideração que se lhes devota. Trata-se de não ver, num ser humano, uma presa à mercê de alguém, apenas por ser mulher. Por mais que muita gente insista em que a sociedade evolui por si própria, num processo natural, sem necessidade de exageros e sobressaltos, estes são essenciais. Tem de haver solavancos e ruturas. São necessárias pessoas que se atrevam a dar passos no desconhecido, quebrando tabús. A Jette não foi a primeira mulher a viajar sozinha. Mas mulheres dessas ainda representam uma exceção.

E não esqueçamos igualmente a mentalidade europeia. Foi na velha e bela Europa que isto aconteceu. Não poderia ter acontecido em muitas outras partes do mundo.

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19 de fevereiro de 2025

Um ano com D. Dinis (6)

 CANTIGA DE AMOR DE D. DINIS*

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Codex Manesse

 

Como justificareis a minha morte perante Deus? Pois que me matastes a mim, cujo único mal é o grande amor que vos tenho, que não há amor maior, e por vós morrerei. Essa será a única razão que Lhe podeis dar da minha morte, não O podereis enganar, que Ele bem sabe quanto vos amo e que nunca mereci que de vós me adviesse a morte. Por tal injustiça, nunca d’ Ele obtereis perdão, pelo que sereis condenada, quando todos formos diante d’ Ele.

Que razom cuidades vós, mia senhor,
dar a Deus, quand’ ant’ El fordes, por mi
que matades, que vos nom mereci
outro mal senom que vos hei amor
aquel maior que vo-l’ eu poss’ haver,
ou que salva lhi cuidades fazer
da mia morte, pois por vós morto for?

Ca na mia morte nom há razom
bona que ant’ El possades mostrar,
desi nom o er podedes enganar,
ca El sabe bem quam de coraçom
vos eu am’ e nunca vos errei;
e por em quem tal feito faz bem sei
que em Deus nunca pod’ achar perdom.

Ca de pram Deus nom vos perdoará
a mia morte, ca El sabe mui bem
ca sempre foi meu saber e meu sem
en vos servir. Er sabe mui bem
que nunca vos mereci por que tal
morte por vós houvesse, por em mal
vos será quand’ ant’ El formos alá.

 

*Não está ligada à data de hoje (penso não se saber quando foi criada), mas irei aleatoriamente publicando poesia de D. Dinis.

16 de fevereiro de 2025

Rapidinhas de História #19

 A VERDADEIRA ESTRATÉGIA DE D. TERESA

 


 

Um ano com D. Dinis (5)

 ACLAMAÇÃO DE D. DINIS E A QUESTÃO DO ALGARVE

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D. Dinis foi aclamado rei de Portugal há 746 anos. Tinha apenas dezassete.

A aclamação deu-se depois da morte de seu pai, nesse mesmo dia. D. Afonso III foi sepultado em São Domingos de Lisboa. Dez anos mais tarde, foi trasladado para Alcobaça.

Também a 16 de Fevereiro, mas doze anos antes, foi assinado em Badajoz o documento que legitimou para sempre a integração do Algarve em Portugal.

D. Afonso III conquistara as praças do Algarve com a ajuda da Ordem de Santiago, cujos cavaleiros portugueses estavam dependentes do Mestre castelhano. Por isso se sentia o rei Afonso X de Leão e Castela com direito a exigir vassalagem ao monarca português por esse território.

Conquista de Loulé.jpgConquista de Loulé, Luís Furtado

Os primeiros passos para a resolução do problema foram dados em Maio de 1253, quando D. Afonso III, ignorando o seu casamento com Matilde de Bologne, desposou a filha mais velha do rei castelhano (ilegítima) D. Beatriz. Depois do nascimento de D. Dinis, Afonso X de Castela enfeudou o Algarve ao neto, a fim de acabar com a situação de vassalagem do rei português ao castelhano, causadora de mal-estar em Portugal.

Porém, se ele aliviou a situação, não a resolveu. Uma vez chegado ao trono, D. Dinis deveria igualmente prestar vassalagem ao rei castelhano por aquele território. Iniciou-se uma acção diplomática e, no dia 16 de Fevereiro de 1267, em Badajoz, Afonso X concordou em renunciar a todos os seus direitos sobre o Algarve, recebendo em compensação as povoações de Aroche e Aracena, conquistadas por Afonso III em 1251. O Guadiana ficou a demarcar a fronteira entre Portugal e Leão, a partir da foz do Caia para sul. Essa fronteira seria modificada trinta anos depois, pelo próprio D. Dinis, no Tratado de Alcañices (12 de Setembro de 1297).

Afonso X.jpg Afonso X, "o Sábio", avô materno de D. Dinis

 

14 de fevereiro de 2025

Uma jovem de vinte anos, uma égua e uma viagem da Alemanha até Portugal (7)

 

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O atravessar da fronteira (frame)

14 de Novembro de 2024, 68º dia de viagem: partindo de La Alamedilla, Jette atravessou a fronteira, perto de Aldeia da Ribeira, concelho do Sabugal.

Chegava finalmente a Portugal e a paisagem encantou-a, desde o primeiro minuto. Só o tempo não estava agradável, com frio e chuva miudinha. Jette escreveu no seu diário nunca ter pensado passar mais frio em Portugal do que em Espanha. Típico de alemães, têm sempre a ideia de que em Portugal nunca faz frio…

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Continuam as manadas de bovinos

Jette penetrou na Reserva Natural da Serra da Malcata, atravessou um rio e passou por um lago formado por uma barragem. Depois de uma consulta ao Google Maps, presumo ter sido na zona de Alfaiates.

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Mais tarde, ela enviou a sua localização à pessoa que a hospedaria, em Souto. Um homem veio ao seu encontro, igualmente a cavalo (nada devendo, em cortesia, aos espanhóis) e guiando-a até às cavalariças, onde a Pinou ficou instalada.

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Na aldeia, Jette pernoitou numa, como ela escreveu, “casa enorme”. Depois do jantar, foi levada a um bar, onde toda a gente falava inglês (nisto, temos claramente vantagem em relação a nuestros hermanos), proporcionando-lhe bons momentos de conversa.

15 de Novembro de 2024, 69º dia de viagem: de Souto a Vale da Senhora da Póvoa.

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À despedida, o dono da quinta onde Jette pernoitou surpreendeu-a com uma t-shirt da sua propriedade.

Pelo caminho, o mapa mostrava uma ponte, onde poderia atravessar um pequeno rio. Lá chegada, porém, Jette viu apenas uma passagem estreita, sem qualquer tipo de proteção.

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Não vislumbrando alternativa, Jette fez-se à travessia arriscada. E a Pinou passou o teste com bravura.

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Esta foi uma etapa cansativa e demorada, com subidas e descidas íngremes e alguma chuva.

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Começou a escurecer, antes de chegarem ao seu destino, e tiveram de usar uma estrada com trânsito automóvel. Mesmo provida de colete refletor e iluminação no seu capacete (frente e traseira), Jette esteve em permanente alerta, respirando de alívio, quando finalmente chegou.

Foi convidada para jantar e passou um serão agradável. Mas, quando se recolheu, lembrou-se dos cães acorrentados, ao longo do caminho, e acabou por escrever no seu diário (tradução minha): “Em Espanha e em Portugal, os animais são frequentemente mantidos de maneira diferente ao que estou habituada: muitos cães estão permanentemente acorrentados, burros e cavalos trancados, ou amarrados no meio do nada. Isto deprimiu-me um pouco.”

16 de Novembro de 2024, 70º dia de viagem: de Vale da Senhora da Póvoa até Pedrógão de São Pedro. 25,8 km, com alguns montes para vencer.

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Como sempre, Jette desmontou nas subidas. Por vezes, até largou a Pinou, para que ela pudesse escolher o próprio ritmo. E a égua acabou por surpreender a moça com a sua agilidade. Era mais rápida, mas esperava por ela, quando a distância entre as duas aumentava. A relação entre a moça e a égua atingira a perfeita harmonia. E Jette, caminhando atrás, constatou que a Pinou estava mais musculosa do que antes da viagem.

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As canseiras eram recompensadas com a beleza da paisagem, embora o tempo continuasse chuvoso.

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Em Pedrógão de São Pedro, ficaram instaladas na quinta de uma senhora que Jette conhecia do Instagram.

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A moça resolveu repousar durante um dia. O cansaço não foi, porém, o único motivo para a pausa. As duas tinham apenas mais uma etapa pela frente e Jette, apesar de se sentir aliviada por as duas terem vencido tantos quilómetros sãs e salvas, receava o momento da despedida.

Aproveitou a pausa para escovar a Pinou e tratar-lhe dos cascos.

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Depois do jantar, tornou a ir ao estábulo, a fim de passar aquele último serão junto com a égua. Pinou deitou-se e Jette sentou-se junto a ela. Não evitou verter lágrimas, mal acreditando que a aventura estava quase a terminar.

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18 de Novembro de 2024, 72º dia de viagem: os últimos 20 km. Sol e 20ºC.

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Jette passou o dia cheia de sentimentos contraditórios, tanto chorava, como se alegrava.

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A chegada ao seu destino foi registada em vídeo pela dona da Pinou. Jette experimentou uma turbulência de emoções. Não aguentou. Levou a mão aos olhos, chorando mais uma vez. O vídeo pode ser visto no Instagram, não penso que exista alguma maneira de eu o trazer para aqui. Mas deixo um frame:

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A aventura durou quase dois meses e meio. Jette e Pinou percorreram sozinhas 1.595,49 km.

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Passado cinco dias, a moça foi apanhar o avião a Lisboa, de regresso à Alemanha.

 

Todas as fotografias e informações aqui divulgadas foram retiradas do diário de viagem de Jette:

https://www.instagram.com/jette.horse.journey/

@jette.horse.journey

 

Nota: três semanas depois da sua chegada à Alemanha, Jette teve a calma e a distância suficientes para fazer um balanço da viagem, concluindo, dessa forma, o seu diário. Penso que ela foca alguns pontos e momentos interessantes. Por isso, na próxima sexta-feira, vou postar algumas dessas impressões.

11 de fevereiro de 2025

Um ano com D. Dinis (4)

 

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Faz hoje 744 anos que D. Dinis e D. Isabel casaram por procuração.

O matrimónio de D. Dinis representou um problema, pois, por desavenças entre seu falecido pai D. Afonso III e o clero, o reino de Portugal esteve sob interdito durante cerca de vinte anos, ou seja, salvo raras exceções, as igrejas mantiveram-se fechadas, sendo proibidas todas as cerimónias religiosas, assim como os sacramentos.

O consórcio com D. Isabel foi combinado, a fim de quebrar a supremacia de Castela. D. Dinis nomeou três procuradores, que, a 11 de Fevereiro de 1281, o representaram, por palavras de presente, na cerimónia de recebimento de D. Isabel de Aragão, no Paço Real de Barcelona. Os três procuradores eram os cavaleiros João Pires Velho e Vasco Pires e o clérigo D. João Martins de Soalhães, futuro bispo de Lisboa.

D. Dinis tinha dezanove anos e D. Isabel apenas dez. Casamentos destes eram habituais, na Idade Média, principalmente, no meio nobre. Representavam, acima de tudo, uma aliança entre duas famílias. Por vezes, eram combinados consórcios entre crianças (noivo e noiva) de quatro ou cinco anos.

Isto não quer, porém, dizer que a prática da pedofilia fosse comum. Normalmente, aguardava-se que a jovem esposa atingisse idade apropriada para consumar a união. O primeiro parto costumava acontecer aos quinze ou dezasseis anos. D. Isabel tinha aliás já dezanove anos.

D. Isabel era filha do rei D. Pedro III de Aragão e de D. Constança da Sicília. Só deu entrada em Portugal cerca de ano e meio depois da cerimónia em Barcelona, sendo as bodas do par real festejadas em Trancoso, a 26 de Junho de 1282.

O casamento de D. Dinis e D. Isabel durou quase quarenta e quatro anos. O casal teve dois filhos: a infanta D. Constança (rainha de Castela, por casamento) e o infante D. Afonso, futuro rei D. Afonso IV.

10 de fevereiro de 2025

Pela Europa 3

Contornar Paris significa fazer cerca de 90 km de auto-estrada, com velocidade controlada (entre os 70 e os 110 km/h). Demora de uma a duas horas, depende do trânsito. Neste caso, foi na melhor das alturas: entre as sete e as oito da manhã de um Domingo. Começa e acaba com as barreiras das portagens, pois a zona urbana (os tais 90 km) é gratuita.

Cuidado com os excessos de velocidade! Já recebemos uma multa em casa, na Alemanha, por termos excedido o limite (depois de descontada a tolerância) em 6 km/h.

Numa próxima oportunidade, publicarei um vídeo numa hora de movimento.


 

8 de fevereiro de 2025

Um ano com D. Dinis (3)

 O SUCESSOR DE D. DINIS

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Faz hoje 734 anos que nasceu um dos reis mais enigmáticos da nossa História: D. Afonso IV

Ficou sobretudo conhecido por ter mandado assassinar Inês de Castro, embora os verdadeiros contornos dessa conspiração permaneçam nebulosos.

D. Afonso IV era filho de D. Dinis e de D. Isabel. Diz-se que era mau e irascível desde a infância, o que não deixa de ser curioso, sendo os seus pais um rei exemplar e uma rainha "santa". Muitas vezes me pergunto: porque não conseguiram D. Dinis e D. Isabel transmitir bom carácter ao filho? E porque nunca D. Dinis se deu bem com o seu próprio herdeiro? Coisas que ficarão para sempre envolvidas na bruma dos séculos...

D. Afonso IV casou com a infanta D. Beatriz de Castela, dois anos mais nova, filha de seu tio-avô, o rei D. Sancho IV, e de D. Maria de Molina. O casamento parece ter sido feliz, Afonso IV é mesmo um caso raro entre os monarcas portugueses, pois não se lhe conhecem barregãs nem filhos ilegítimos. Não deixa de ser estranho num homem que se julga ter sido destituído de escrúpulos.

Terá sido dono de grande moralidade, transmitida pela mãe D. Isabel? Isto poderia explicar a sua falta de tolerância a desvios de comportamento do seu filho e herdeiro, D. Pedro I. E também explicaria que, sendo mais ligado à mãe, se tivesse afastado do pai. Na verdade, D. Dinis preferia a companhia do seu bastardo Afonso Sanches.

A infanta D. Beatriz de Castela, rainha de Portugal, viveu na corte portuguesa desde os quatro anos de idade. Foi criada pela sogra D. Isabel, assim que ficou estabelecido o seu consórcio com o príncipe herdeiro, por ocasião do Tratado de Alcañices, a 12 de Setembro de 1297. Neste Tratado, ficaram definitivamente estabelecidas as fronteiras do reino português. 

Todas as informações conhecidas sobre D. Afonso IV estão reunidas na biografia de autoria de Bernardo Vasconcelos e Sousa (Círculo de Leitores, 2005).

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