Em todos os momentos da História, seja na Antiguidade, na Idade Média, ou no nosso tempo, são as mesmas paixões e os mesmos desígnios que inspiram os humanos. Entender a História é entender melhor a natureza humana.

8 de maio de 2025

Um ano com D. Dinis (27)

O 1º CONDE DE BARCELOS

Faz hoje 727 anos que D. Dinis tomou uma medida inédita, em Portugal.

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Imagem daqui

 

O Rei Lavrador outorgou um título simbólico a um fidalgo, o título de conde, sem estar ligado à sua função original: a de ser governante de um condado. Tratava-se apenas de um título de prestígio.

A 8 de maio de 1298, D. Dinis outorgou a carta de doação da vila de Barcelos «por serviço que me fez dom João Afonso [Telo] e porque o fiz conde».

D. João Afonso Telo era um nobre leonês, senhor do castelo de Albuquerque, mas com ligações familiares a Portugal. Tornou-se grande amigo de D. Dinis, exercendo atividades diplomáticas em nome da Coroa portuguesa. O Rei Lavrador decidiu recompensá-lo, dando-lhe o título de conde de Barcelos, mas de poder muito limitado, já que se confinava à vila de Barcelos. Este modo de proceder estava de acordo com a política de D. Dinis de restringir o poder da nobreza, concentrando-o na Coroa.

 

4 de maio de 2025

Um ano com D. Dinis (26)

 CASAMENTO DE D. AFONSO III

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Representação de D. Afonso III na Viagem Medieval de Santa Maria da Feira 2015

 

Há três dias, mencionei aqui o casamento de D. Afonso IV. Hoje, é a vez do avô, D. Afonso III, cujo segundo consórcio se realizou em 1253, cinquenta e seis anos antes do do neto, que aliás nunca conheceu. É curioso verificar haver três pontos em comum entre os dois enlaces. Também o pai de D. Dinis casou no mês de maio, também no caso dele não se sabe o dia e a sua noiva ostentava os mesmos nome e estatuto: infanta D. Beatriz de Castela. A diferença de idades entre os nubentes era, porém, muito maior, neste caso: a noiva teria apenas onze anos, o noivo ia pelos quarenta.

Este casamento surgiu na sequência de um Tratado de Paz entre Portugal e Castela por causa da questão do Algarve. Mas D. Afonso III foi acusado de bigamia pelo papa Alexandre IV, que, dois anos mais tarde, lançaria o interdito sobre Portugal. Um reino sob interdito estava proibido de celebrar missas e sacramentos (incluindo casamentos e batizados), situação que durou quase dez anos.

A razão para medida tão severa: à altura do seu casamento com D. Beatriz, D. Afonso III era ainda casado com Matilde de Boulogne. O pai de D. Dinis passou a sua juventude na corte francesa, durante a regência de sua tia Branca, antiga infanta de Castela. Em 1239, a tia arranjou-lhe casamento com a viúva Matilde de Boulogne, bastante mais velha do que ele, mas filha única da condessa Ida e herdeira daquele condado.

Passados seis anos, porém, D. Afonso regressou sozinho a Portugal, a fim de tomar conta do reino mal governado por seu irmão D. Sancho II. Oito anos mais tarde, já coroado rei, e no intuito de pôr fim ao conflito com o monarca castelhano por causa do Algarve, casou com Beatriz, ignorando Matilde por completo, de quem aliás vivera separado todo este tempo.

D. Afonso III chegou ao ponto de ignorar uma ordenação papal para se apresentar em Roma, a fim de ser julgado por bigamia. O problema resolveu-se, contudo, por si, pois Matilde morreria inesperadamente. Mas só em junho de 1263, passados cinco anos sobre a morte da malograda condessa,  um novo papa, Urbano IV, legitimou o segundo consórcio do monarca, levantando o interdito sobre o reino.

À altura do seu nascimento, a 9 de outubro de 1261, D. Dinis era, no fundo, ilegítimo e este argumento foi usado por seu irmão Afonso, quando, pela terceira vez, se revoltou contra o rei, em 1299, obrigando D. Dinis a montar cerco a Portalegre. D. Afonso alegava ter mais direito ao trono por ter nascido numa data mais próxima da legalização do casamento dos pais (6 de fevereiro de 1263).

D. Afonso III e D. Beatriz tiveram sete filhos:

Infanta D. Branca, nascida em fevereiro de 1259

D. Dinis, nascido a 9 de outubro de 1261

Infante D. Afonso, nascido a 6 de fevereiro de 1263

Infanta D. Sancha, nascida a 2 de fevereiro de 1264 (faleceu com cerca de vinte anos)

Infanta D. Maria, nascida em fevereiro ou março de 1265 (faleceu com pouco mais de um ano)

Infante D. Vicente, nascido a 22 de janeiro de 1268 (falecido ainda criança)

Infante D. Fernando, nascido em 1269, falecendo pouco tempo depois.

1 de maio de 2025

Um ano com D. Dinis (25)

CASAMENTO DE D. AFONSO IV

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Em maio de 1309 (não se sabe o dia), o futuro rei D. Afonso IV, filho de D. Dinis, casou com a infanta D. Beatriz de Castela. Viriam a ser os pais de D. Pedro I, conhecido pelo seu amor trágico por Inês de Castro (tendo ficado seu pai com a “fama” de a haver mandado assassinar, embora não exista certeza histórica).

À altura do casamento, D. Afonso tinha dezoito anos e a sua noiva dezasseis ou dezassete. Os dois conheciam-se desde a infância. D. Beatriz foi criada pelos sogros, vindo para a corte portuguesa na sequência do Tratado de Alcanices, celebrado a 12 de Setembro de 1297, no qual se definiram definitivamente as fronteiras entre Portugal e Castela e se estabeleceu um duplo consórcio. Ficou igualmente estipulado que D. Fernando IV de Castela, à altura com onze ou doze anos, casaria com a infanta D. Constança de Portugal.

Era costume as noivas-crianças serem criadas pelos sogros. O par real português e a rainha viúva castelhana, D. Maria de Molina, trocaram de filhas. D. Beatriz, de cinco anos, veio para Portugal, enquanto D. Constança, de sete, foi viver para a corte castelhana.

Para a concretização deste duplo consórcio, foi necessário solicitar dispendiosas bulas de dispensa de parentesco ao papa, pois os nubentes eram parentes próximos. Os infantes castelhanos eram filhos do falecido D. Sancho IV, tio de D. Dinis.

No caso de D. Afonso IV e de D. Beatriz, parece ter sido vantajoso terem crescido juntos. Não obstante a tradição  ter conferido um temperamento irascível a este monarca português, ele parece ter-se inteiramente dedicado à família, pois não se lhe conhecem barregãs, nem filhos ilegítimos. Trata-se de um caso raro na nossa historiografia.

O casal teve sete filhos, mas apenas três chegaram à idade adulta, porquanto a mais nova, Leonor, que casou com D. Pedro IV de Aragão, morreu com apenas vinte anos.

 

25 de abril de 2025

24 de abril de 2025

Um ano com D. Dinis (23)

COMPROMISSO DE CASAMENTO

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Estátuas de D. Dinis e D. Isabel, em Leiria

 

Faz hoje 744 anos que D. Dinis assinou o seu compromisso de casamento, em pleno cerco de Vide. O rei cercara o irmão Afonso por este ter decidido construir muralhas em torno da vila e aumentar uma torre, sem lhe pedir autorização.

Os agentes de D. Pedro III de Aragão, o pai da noiva, eram Conrado Lanceote e Bertrando de Vila Franca. O Rei Lavrador fez doação à noiva por núpcias das vilas de Óbidos, Abrantes e Porto de Mós, doação que ficava assegurada pelas arras dos castelos de Vila Viçosa, Monforte, Sintra, Ourém, Feira, Gaia, Lanhoso, Nóbrega, Santo Estêvão de Chaves, Monforte de Rio Livre, Portel e Montalegre e mais dez mil libras.

Na verdade, D. Dinis e D. Isabel, já estavam casados, nesta altura, embora ainda não se conhecessem. O casamento ocorreu por procuração, a 11 de fevereiro de 1281, no Paço Real de Barcelona. Os cavaleiros João Pires Velho e Vasco Pires e o clérigo D. João Martins de Soalhães, futuro bispo de Lisboa representaram o rei, por palavras de presente, na cerimónia de recebimento da noiva.

D. Isabel só deu entrada em Portugal cerca de ano e meio mais tarde, sendo as bodas do par real festejadas em Trancoso, a 26 de junho de 1282.

A tradição diz-nos que D. Dinis não apreciava os exageros caritativos da sua rainha. E que esta muito sofreu com os casos extra-conjugais do marido. A este propósito, transcrevo um pequeno excerto do meu romance:

 

Num serão abafado e quente de Junho, vieram dizer-lhe que a rainha não viria aos seus aposentos, como por ele solicitado, pois preparava-se para ir ao hospital de Santo Elói. Dinis dirigiu-se furioso ao Paço da sua consorte, apanhando-a já de saída, envolta pela cabeça numa capa escura muito simples, de camponesa.

- Proíbo-vos de deixar o Paço!

Ela limitou-se a replicar:

- Tenho os meus compromissos.

- Que adiareis, por uma vez. Hei mister de vos falar. Ou serão os vossos enfermos mais importantes do que el-rei?

- Não se trata de serem mais ou menos importantes. Trata-se de cuidar de quem necessita.

- Também eu hei mister de algo: de esclarecimentos. Dizei, que vos incomoda? Foi algo que disse ou… fiz?

Isabel fixou-o com os seus olhos perscrutadores. Dinis pensou ver naquele brilho uma certa acusação, algum ciúme, e convenceu-se de que ela realmente se vingava do sucedido em Coimbra. Em vez de se sentir culpado, porém, empertigou-se. Quiçá fosse aquele jeito dela de desprezar tudo o que fosse mácula humana. Mas não lhe competia, afinal, aceitar que ele tivesse as suas barregãs?

 

21 de abril de 2025

E porque a data se aproxima de novo...

 ... venho lembrar este meu livro:

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Algumas palavras da editora:

"Este talvez seja o único relato escrito sobre o que foi ser uma menina nos tempos da Revolução dos Cravos. Cristina Torrão, com sua prosa precisa e ágil, faz o leitor ver o que aconteceu quando a exploração, a desigualdade de género, a repressão sexual e a alienação cultural impostas pelo salazarismo estremeceram e desabaram sob o impacto libertador da Revolução dos Cravos".

 

O livro pode ser comprado aqui:

https://kotterpt.com/a-revolucao-da-veronica

19 de abril de 2025

Um ano com D. Dinis (22)

 MOSTEIRO DE SANTA CLARA DE COIMBRA

 

 

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Mosteiro de Santa Clara-a-Velha

 

A 19 de abril de 1314, D. Isabel obteve do papa Clemente V autorização para fundar o mosteiro de Santa Clara, em Coimbra. Neste mesmo dia, a rainha fez o seu primeiro testamento, onde expressou o desejo de ser enterrada em Alcobaça, desejo que viria a modificar num outro testamento, optando por Santa Clara. É curioso verificar ela não ter desejado ser sepultada junto de D. Dinis, no mosteiro de Odivelas. O rei morreu onze anos antes dela.

Clemente V foi o papa que extinguiu os Templários. A autorização para a fundação do mosteiro de Santa Clara foi das últimas, senão a última, por ele outorgada, pois morreu apenas um dia depois.

15 de abril de 2025

Um ano com D. Dinis (21)

D. DINIS E O BISPO DO PORTO

 

Devido à sua política de centralização de bens na Coroa, D. Dinis teve muitos problemas com a nobreza e o clero. Um prelado que exerceu forte oposição foi D. Vicente, bispo do Porto, por sinal, padrinho do Rei Trovador. Aqui, uma cena do meu romance:

 

Em finais de Junho, Dinis deslocou-se ao Porto, onde o bispo D. Vicente o recebeu no seu Paço, no ponto mais alto do burgo sobranceiro ao rio Douro. O rei tentava contemporizar, mas o velho bispo mostrava-se intransigente. O monarca comprometera-se a não levantar obstáculos aos eclesiásticos no que se referia a adquirirem bens de raiz e, entretanto, já havia promulgado duas leis de desamortização dos bens do clero. Era um escândalo, declarava D. Vicente furioso. E não estava sozinho. Junto com os bispos D. João Martins da Guarda , D. Egas de Viseu e D. João de Lamego preparava um libelo com mais acusações contra a Coroa, a fim de o enviar ao papa.

Dinis pretendia evitar tal procedimento a todo o custo:

- Estou certo de que conseguiremos resolver o assunto entre nós.

- Não vejo como, Alteza. Se, passados três anos sobre a Concordata, ainda nos encontramos neste ponto, dificilmente a situação se modificará.

O velho clérigo, ao abrigo da sua idade e da sua experiência, não se deixava intimidar. Fizera frente ao pai e nada o impedia de o fazer ao filho.

Dinis insistiu:

- Presumo que não estareis interessado num novo interdito, depois do trabalho que deu levantá-lo. Seria uma desgraça para o reino. Vós, como homem da Igreja, vedes certamente ainda mais desvantagens nisso do que eu…

- Como homem da Igreja, D. Dinis, estou preparado para aceitar qualquer castigo que o pontífice resolva impor. O reino sobreviveu a mais de vinte anos de interdito e não deixou de ser cristão. Se for essa a única maneira de acabar com as inquirições abusivas e as escandalosas leis de desamortização, que seja!

D. Vicente era um osso duro de roer. E Dinis estava cheio do Porto, nunca achara grande beleza no cinzentismo das construções de granito e do próprio Douro, entalado naquele desfiladeiro. E não se livrava da humidade peganhenta. Mesmo agora, no pino do Verão, chovia quase todos os dias.

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8 de abril de 2025

Um ano com D. Dinis (19)

 NASCIMENTO DE D. PEDRO I E CERCO A PORTALEGRE

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Representação do Rei Pedro I de Portugal na Sala dos Reis, Quinta da Regaleira, Sintra

https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=62092638

Faz hoje 705 anos que nasceu D. Pedro I. Como todos sabemos, este rei ficou sobretudo conhecido pelo seu trágico amor por Inês de Castro.

D. Pedro I era neto de D. Dinis e de D. Isabel, filho de D. Afonso IV. Nasceu numa época complicada, em plena guerra civil, que opunha o seu avô ao seu pai.

Inês de Castro viria a ser assassinada no Paço mandado construir pela rainha Santa Isabel, junto ao mosteiro de Santa Clara, em Coimbra.

 

Nota: Encontrei datas diferentes (18 e 19 de abril) para o nascimento de D. Pedro I, na internet. A data de 8 de abril de 1320 é, contudo, apontada pela Dra. Cristina Pimenta, autora da biografia de D. Pedro I (Temas e Debates 2007). Também o Professor Bernardo Vasconcelos e Sousa, autor da biografia de D. Afonso IV (pai de D. Pedro) e o Profesor Sotto Mayor Pizarro, autor da biografia de D. Dinis (avô de D. Pedro) apontam esta mesma data.

 

Também a 8 de abril, mas em 1299, D. Dinis fez o seu primeiro testamento, antes de partir para uma campanha contra o irmão (o rei contava trinta e sete anos). O infante D. Afonso revoltava-se pela terceira vez. D. Dinis montou cerco a Portalegre, a 27 de abril. O irmão resistiu mais tempo do que o esperado e o rei solicitou a intervenção da infanta D. Branca, a irmã de ambos.

Depois de a infanta ter conferenciado com o irmão mais novo, trouxe informações incomodativas.

- Afonso anda mui estranho - anunciou Branca a Dinis. - Acha-se com mais direito ao trono do que vós.

Com dificuldades em controlar a sua fúria, o rei remeteu-se ao silêncio. E foi Frei Vasco Fernandes quem inquiriu:

- Em que se baseia D. Afonso para afirmar tal?

Depois de uma hesitação, Branca acabou por responder:

- Baseia-se no facto de o matrimónio de meus pais só haver sido reconhecido pela Igreja em Junho de 1263.

Gerou-se um silêncio embaraçante, perante o abordar de um assunto julgado esquecido. À altura do seu matrimónio com D. Beatriz, Afonso III havia sido acusado de bigamia pelo papa Alexandre IV. O rei estava ainda casado com Matilde de Boulogne, apesar de o casal já viver separado há quase uma década.

Seguiram-se cinco anos de contendas graves com a cúria pontifícia. O problema acabou por se resolver com a morte inesperada de Matilde, mas só passada mais meia década, Urbano IV legitimara o segundo consórcio do monarca.

- Afonso nasceu em Fevereiro de 1263 - prosseguiu Branca, - escassos quatro meses antes de o papa passar a bula de legitimação. Essa é a razão por ele dada para se considerar, digamos, mais legítimo do que o irmão rei.

Dinis tinha ganas de ir arrancar o estouvado do irmão ao castelo de Portalegre, a fim de lhe dar uma valente sova.

O infante D. Afonso só se renderia em outubro, logo partindo para o reino de Múrcia, onde possuía senhorios, por parte da esposa.

 

Nota: Apesar de se tratar de um excerto do meu romance (obra de ficção), na sua biografia de D. Dinis, o Professor Sotto Mayor Pizarro refere o infante D. Afonso ter realmente usado este argumento para se considerar com mais direito ao trono do que o irmão mais velho.

 

6 de abril de 2025

Um ano com D. Dinis (18)

 CANTIGA DE AMOR DE D. DINIS

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A imagem mostra uma anotação musical original de D. Dinis (encontra-se no Arquivo Nacional da Torre do Tombo). O rei poeta não só escrevia os versos, como compunha a música das suas cantigas. Pelo menos, em alguns casos. Não é claro quantas músicas compôs.

Segue-se uma Cantiga de Amor de D. Dinis (com tradução em português actual):

«O meu grande mal foi pousar os olhos na “mia senhor”, pelo que muitas vezes me amaldiçoei, e ao mundo e a Deus. Desde que a vi, nunca mais recordei outra coisa, se não ela; nunca mais sofri por outra coisa, senão por ela. Faz-me querer mal a mim mesmo e desesperar de Deus. Por ela, quer este meu coração sair do seu lugar e eu morro, já depois de ter perdido o juízo e a razão. Todo este mal ela me fez e mais fará».

A mia senhor que eu por mal de mi
vi, e por mal daquestes olhos meus
e por que muitas vezes maldezi
mi e o mund’e muitas vezes Deus,
des que a nom vi nom er vi pesar
d’ al, ca nunca me d’ al pudi nembrar.

A que mi faz querer mal mi medês
e quantos amigos soía haver,
e desasperar de Deus, que mi pês,
pero mi tod’ este mal faz sofrer,
des que a nom vi nom er vi pesar
d’ al, ca nunca me d’ al pudi nembrar.

A por que mi quer este coraçom
sair de seu lugar, e por que já
moir’ e perdi o sem e a razom,
pero m’ este mal fez e mais fará,
des que a nom vi nom er vi pesar
d’ al, ca nunca me d’ al pudi nembrar.

 

In "Cancioneiro de D. Dinis", Nuno Júdice (Editorial Teorema, 1997)

 

4 de abril de 2025

Um ano com D. Dinis (17)

 D. AFONSO X DE LEÃO E CASTELA

Verifica-se hoje o 741º aniversário da morte de D. Afonso X de Leão de Castela, o Sábio. Afonso X era o avô materno de D. Dinis e igualmente poeta. Deixou as Cantigas de Santa Maria para a posteridade, um conjunto de quatrocentas e vinte e sete composições em galaico-português, à época, a língua fundamental da lírica culta em Castela.

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Imagem daqui

Como se vê, D. Dinis tinha a quem sair, não só no que diz respeito à poesia, como a outras medidas régias. Também o avô foi um grande legislador, autor do Fuero Real de Castilla, um conjunto de leis adaptadas às diversas regiões dos seus reinos, e das Siete Partidas, leis baseadas no direito romano. D. Afonso X determinou que os documentos régios fossem redigidos em castelhano, substituindo o latim, e assim o neto Dinis viria a fazer com o português. Fundou igualmente a Escola de Tradutores de Toledo, onde se traduziam documentos do árabe, do grego e do latim para o castelhano. Inúmeros estudiosos de várias nacionalidades se reuniram nessa Escola, pelo que o reinado de D. Afonso X ficou conhecido por as três religiões - cristã, judaica e muçulmana - terem convivido pacificamente em Toledo.

2011-06-08 Toledo 159.JPGCatedral de Toledo Foto © Horst Neumann

Este rei poderoso e culto teve um fim amargo. Descontentes com a sua política de centralização de bens na Coroa, os nobres revoltados conseguiram depô-lo, substituindo-o por seu filho Sancho IV.

D. Afonso X viveu os seus últimos anos em exílio, na cidade de Sevilha. Sua filha D. Beatriz, mãe de D. Dinis, acompanhou-o nessa fase difícil, pelo que o pai lhe deixou, em herança, as vilas de Moura, Serpa, Noudar e Mourão. Esta herança permitiu a D. Dinis alargar a fronteira portuguesa para leste do Guadiana.

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D. Afonso X o Sábio, retratado no Libro de los Juegos, ou Libro de acedrex, dados e tablas.

A obra foi encomendada pelo próprio monarca e data de 1283.

 

30 de março de 2025

Rapidinhas de História #24

A MUI COBIÇADA GALIZA (4)


 

Nota: as Rapidinhas de História vão fazer uma pausa. Regressam daqui a algumas semanas, com mais informações históricas sobre o período da formação de Portugal, informações recolhidas em estudos e teses que me foram postos recentemente à disposição.

24 de março de 2025

Um ano com D. Dinis (16)

 FORAIS DE MIRANDELA E DE BEJA

 

2015-01-05 Mirandela 081.JPGMirandela - Câmara Municipal © Horst Neumann

Verifica-se, durante o mês de março (não se sabe o dia), o 734º aniversário do foral de Mirandela e da confirmação do foral de Beja.

Acabara de nascer o futuro D. Afonso IV, herdeiro de D. Dinis, e no foral de Mirandela, o rei referiu, com orgulho, o mesmo ser concedido juntamente com a rainha «e com os meus filhos Infantes Dom Afonso e Dona Constança». A filha tinha pouco mais de um ano.

 

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Castelo de Beja © Horst Neumann