Em todos os momentos da História, seja na Antiguidade, na Idade Média, ou no nosso tempo, são as mesmas paixões e os mesmos desígnios que inspiram os humanos. Entender a História é entender melhor a natureza humana.

22 de julho de 2013

Naquele Tempo (20)


À protecção divina sucedeu a ideia de uma quase sobrenatural permanência do «espírito nacional» (Volksgeist) através de todas as vicissitudes do tempo, a indesmentida capacidade de vencer os inimigos ou de renascer da morte apesar de todas as derrotas, a inesgotável proliferação dos heróis capazes de dar a vida pela pátria, o incessante renascimento dos chefes adequados ao momento histórico ou mesmo genialmente capazes de conduzir a nação a admiráveis sucessos. Ao propor o ideal da heroicidade a todos os cidadãos, pelo simples facto de a narrar como história do povo lusíada, a épica quinhentista veio em socorro dos historiadores da nação e marcou indelevelmente cronistas e memorialistas portugueses até aos nossos dias. De uma forma ou de outra, obcecou românticos e liberais, a geração de 70 e os integralistas, os republicanos e os nacionalistas. A grande missão dos historiadores foi, para eles, sucessivamente, ensinar a preservar o «espírito nacional» presente nas instituições municipais, fazer ressurgir a pátria da decadência em que havia caído depois da epopeia marítima, ajudar a recuperar as boas tradições nacionais, esquecendo as contaminações estrangeiradas de ideiais corrompidos e corruptores, ou, pelo contrário, difundir o espírito do progresso para Portugal ser digno do seu passado. E, todavia, todos os historiadores modernos se consideraram, em Portugal, movidos pela racionalidade e descrentes de mitos. Inconscientemente, punham a ciência ao serviço do mito.

As três faces de Afonso Henriques, págs. 455/456


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