Um livro muito interessante sobre um episódio tétrico da
nossa história: a histeria que se criou contra os judeus, em Abril de 1506, em
Lisboa, por causa de uma seca. Com as fontes secas e a agricultura num estado calamitoso, augurando fome, o povo responsabilizou os judeus, na sua
ânsia de encontrar um culpado, perseguindo-os, queimando-os e/ou matando-os com
requintes de malvadez, tudo isto se passando perante a apatia das autoridades.
Como se vê, as atrocidades do século XX, e as que infelizmente já se cometeram
no XXI, não são novidade, nem reflexo da era mais desumana que a história da
Humanidade já conheceu (como já ouvi caracterizar o nosso tempo). E o nosso povo está longe de ter sido pacífico e
inocente, ao longo dos séculos, bem longe de praticar os “brandos costumes”…
Contudo, e apesar de o livro criar muito suspense, não me encheu as medidas.
Berequias, um jovem judeu que tenta sobreviver ao caos, ao mesmo tempo que
tenta descobrir o assassino de seu tio, é um herói à là Dan Brown, ou seja: por mais agruras que passe, por mais
ferimentos que lhe inflijam, por mais noites que passe sem dormir, por mais
correrias que se veja obrigado a fazer, seja pelas ruelas lisboetas,
seja sobre os telhados, tem sempre ânimo para continuar, nunca se cansa, mal
precisando de comer e de dormir, nem tão-pouco os terríveis ferimentos têm
graves consequências. Este ritmo é agradável ao leitor, pois as aventuras
sucedem-se, mas, na minha opinião, torna-se inverosímil.
Além disso, fiquei com a impressão de que na família de
Berequias cada um vivia por si. Claro que, em dias de loucura, os ritmos e as rotinas se quebram, dando lugar ao absurdo, mas
procurei em vão sinais de relações familiares, de algo que me dissesse que tipo
de hábitos se usavam em sua casa, como era a vida familiar em tempo de normalidade.
Mesmo antes de ter começado a histeria, parecia que, naquele lar, não havia uma
ordem, um quotidiano. Sempre que Berequias lá entrava, as pessoas faziam coisas
que o surpreendiam. Até a própria mãe do jovem parece distante dele, como os
dois mal se conhecessem.
Também me incomodou a mudança constante do tempo verbal
entre o pretérito e o presente.
Para quem não é sensível a pormenores destes, o romance
entretém e informa. Além disso, achei interessante haver um assassínio que, à
primeira vista, acontecia na sequência da barbaridade contra os judeus, mas
que, e graças à perspicácia de Berequias, se descobre ter sido cometido por uma
razão bem diferente.
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