Em todos os momentos da História, seja na Antiguidade, na Idade Média, ou no nosso tempo, são as mesmas paixões e os mesmos desígnios que inspiram os humanos. Entender a História é entender melhor a natureza humana.

15 de março de 2012

865 Anos da Conquista de Santarém (1)

A publicação do texto da Ana Sofia Allen inicia a série dedicada aos 865 Anos da Conquista de Santarém. Ela teve a interessante ideia de falar por um ser vivo que a tudo assistiu e sobreviveu, até hoje, para o contar: um carvalho. E eu, ao ler o texto, desejei ter sido esse carvalho:


"Eu sou um ser que vive, entenda-se. Os meus braços alimentam outros seres viventes e dão sombra a quem se senta no meu colo. Um carvalho pode ser um grande amigo, a quem confiam os seus segredos. As crianças em meu redor são a energia que me aquece e as juras gravadas no meu tronco, memórias antigas.
Entre elas, a daquele dia: nada se sentia no ar, nada do que estava para acontecer. O frio cortante do fim de tarde cobria o som dos cascos de cavalos a chegar a Santarém.
À noite, do alto da minha copa, vi três vultos a aproximarem-se das muralhas com uma escada enorme; a partir daí os dados estavam lançados…O estranho neste ataque era o mudo entendimento entre pares. A camaradagem entre os cavaleiros e o rei era a força por detrás da razia, que parecia fulminante.
No final, a lua, minha companheira, tão testemunha do massacre como eu, escondeu-se e com ela foram-se os gritos, os medos e os ódios deixados para trás. Em cada pedra das muralhas um lamento se gravou, e na bandeira então içada, ondulavam as cores da vitória!
A euforia dos novos amos alimentou-se do mito de tesouros escondidos e neste planalto mirante de grandes e férteis planícies, a vida ergueu-se novamente como os novos rebentos da Primavera.
Mesmo passado 865 anos, este episódio continua presente em mim. A conquista de Santarém fez-se por pessoas comuns que ousaram dar liberdade aos seus sonhos, mas o código de honra dos cavaleiros foi ignorado e, em vez disso, a força invisível que eu senti, naquela madrugada de 15 de Março, tornar-se-ia o prenúncio de uma identidade futura, cujas raízes se cravavam na terra funda."

Ana Sofia Allen
11/03/2012

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4 comentários:

JoZé disse...

Completamente diferente, sem dúvida! :)

Cristina Torrão disse...

Até amanhã ;)

Rita disse...

...muito belo :)

Olinda Melo disse...

'Eu sou um ser que vive'

Bom começo. Muitas vezes é nas primeiras palavras que o leitor encontra o incentivo para continuar. E nada como a natureza como testemunha daqueles estranhos tempos.Afonso Henriques era mesmo assim, avesso a cumprir acordos e, neste caso, as tréguas...

Gostei.

Olinda