Em todos os momentos da História, seja na Antiguidade, na Idade Média, ou no nosso tempo, são as mesmas paixões e os mesmos desígnios que inspiram os humanos. Entender a História é entender melhor a natureza humana.

4 de junho de 2016

Quando as crianças são esquisitas a comer. Tudo manias?

Há dias, através dos blogues em destaque na página Sapo, li um post muito interessante de Luís Veríssimo, intitulado: 5 coisas que eu não comia em miúdo.

Diz ele: «Em criança era um castigo para comer. Não gostava de nada, não comia nada. Gostar até gostava, mas havia coisas que não suportava (algumas delas ainda hoje não como), ou porque não me sabiam bem ou porque não eram confeccionadas da melhor forma. (...) Com o tempo o meu paladar melhorou e o meu gosto pela comida também.»

Gostei do texto e pus-me a escrever um comentário. Saiu tão longo, que vou aproveitar para escrever aqui sobre o assunto.

Não comer de tudo, ou, na linguagem dos adultos, "ser esquisito", é um problema muito comum nas crianças. E, afinal, há uma explicação bem simples para o facto de não gostarmos de uma coisa na nossa infância e, em adultos, passarmos a gostar: tanto as nossas papilas gustativas, como o aparelho digestivo, ainda não estão bem formados. É conhecido que os bebés, quando começam a comer alimentos sólidos, têm de se ir habituando devagar aos diversos produtos. Uma das razões para a elevada mortalidade infantil, em tempos passados, era precisamente dar-se às crianças certos alimentos cedo demais, alimentos que elas não conseguiam digerir, que lhes provocavam diarreias ou alergias fatais.

Como vemos, aquilo que muitas vezes é visto como mania tem uma razão fisiológica. É contraproducente obrigar a criança a comer aquilo que abomina, pois ela até pode criar problemas sérios de saúde. Na verdade, trata-se de pura violência! Eu, por acaso, não tinha grandes problemas, comia quase tudo, por uma questão de sorte, penso eu. Por alguma razão, o meu aparelho digestivo habituou-se mais depressa a uma grande quantidade de alimentos. Mas as crianças são diferentes, desenvolvem-se de maneira diferente e o processo pode demorar mais ou menos tempo. Só me lembro de detestar ervilhas de quebrar. Uma vez, a minha mãe insistiu para que eu as comesse, que faziam bem. Duas horas mais tarde, vomitei o jantar completo. Ainda hoje as abomino.

O desenvolvimento mais ou menos rápido das papilas gustativas e do aparelho digestivo é também a explicação para as crianças, de um modo geral, adorarem doces. As papilas sensíveis ao doce são das mais primitivas que temos, pois, quando ainda vivíamos na selva, havia que distinguir o comestível do venenoso e, normalmente, o venenoso identifica-se com um sabor amargo, enquanto que o doce é, regra geral, comestível. A sensibilidade ao doce desenvolve-se, ainda hoje, muito cedo, nos bebés.

A relação com a comida deve ser descontraída, coisa de que muitos pais dão cabo, se os filhos tiverem problemas com vários alimentos. Os pais entram em stress, com medo de que as crianças fiquem doentes. Compreensível. Mas a emenda costuma ser pior do que o soneto.

Claro que também há casos de manias. Aí, depende do conhecimento que os pais têm dos próprios filhos e, para dizer a verdade, muitos não os conhecem bem, pelo que não estão em condições de fazer a distinção. O problema é não se dedicarem aos filhos como deviam. A vida é difícil e preferem delegar a educação dos próprios rebentos noutras mãos: escolas, infantários, bábás, mas também em aparelhos como computador e televisão. Enfim... E as manias até podem ser uma tentativa de chamada de atenção, aliás, justificada, quando os pais são desleixados!

Escusado será dizer que se deve ter muito cuidado com alergias, pois, em casos extremos, podem matar. Quando eu era pequena, reagia alérgica ao tomate cru, ficava cheia de borbulhas, alergia que felizmente passou depois da adolescência. Mas ainda hoje tenho reações levemente alérgicas a certos alimentos considerados saudáveis, como a maçã, ou o ananás. Aliás, não sou grande amiga de frutos, o que me torna muito difícil a mudança para uma alimentação vegetariana, que gostava de conseguir. Mas, sem fruta, o cardápio ficava ainda mais limitado. Compenso comendo menos carne, há semanas em que não chego a ingerir meio quilo. E não chego a comer um bife por mês.

E por falar em fruta: Luís Veríssimo refere que há por aí a teoria de que habitualmente quando não gostamos de comer algo é porque alguém da nossa família próxima, com quem nos damos menos bem, adora essa coisa. E fala no pêssego, que o irmão adora, mas que ele detesta, reagindo mesmo com sinais alérgicos. Esta teoria não deixa de ser interessante. Eu também não suporto pêssegos (fruta, claro), apesar de não ter tido reações alérgicas na minha tentativa de os comer. O interessante é que a minha mãe realmente adora pêssegos!




2 comentários:

  1. Cristina, concordo em absoluto com as suas palavras. A comida é um acto de prazer tão grande que deve ser levado da forma mais descontraída possível. E podemos incutir nas crianças isso mesmo. Comer é um dos meus maiores prazeres. E é assim que a comida deve ser encarada, não como uma obrigação, como muitas vezes é entendida.

    Muito obrigado pelas suas palavras,
    Luís.

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