Os movimentos que clamam ser “Pela Vida” condenam o aborto, seja em que
fase for, já que alegam pretender preservar a vida indefesa que se inicia com a
fecundação do óvulo.
O aborto sempre foi muito condenado, ao longo da História. Porém, por trás
desta condenação, parece-me haver, ainda hoje, muitos resquícios da sociedade patriarcal
machista, sendo o seu principal objetivo criminalizar apenas a mulher. Nos
países em que há leis muito severas contra o aborto, nomeadamente na América
do Sul, os homens costumam ser isentos de qualquer responsabilidade, o que
denota muita cobardia e hipocrisia.
Por outro lado, há, desde 1976, um grande consentimento social em relação à
fertilização in vitro, os chamados
bebés-proveta. Porquê esta disparidade?
As razões parecem óbvias. Ao praticar o aborto, uma mãe rejeita a vida que
cresce dentro de si; por outro lado, subsiste como que uma intenção nobre na fertilização in vitro:
casais, ou mulheres, que não conseguem ter filhos, são ajudados a criar nova
vida. As famílias aplaudem, mesmo as mais conservadoras.
Na minha opinião, este é um dos indícios mais gritantes da sociedade
hipócrita em que vivemos. Quem rejeita o aborto, seja em que circunstâncias
for, devia rejeitar os bebés-proveta com a mesma convicção! A fertilização
artificial cria sempre vários embriões, ou seja, várias vidas humanas. Na
mulher que deseja ser mãe, são implantados até três desses embriões. Só em
cerca de 20% dos casos essa implantação conduz a uma gravidez, a grande maioria
desses embriões é rejeitada pelo corpo ou seja, são abortados. E, mesmo que a
gravidez resulte, há sempre algo que é rejeitado, na pior das hipóteses, duas
crianças. Dir-me-ão que são abortos espontâneos e eu digo que dificilmente se
pode falar em tal, já que a fecundação não se deu por meio natural.
Este não é porém o único problema. Normalmente, são fecundados mais óvulos
do que aqueles que podem ser implantados e ninguém sabe bem qual o destino a dar
a esses embriões. Deixemo-nos então de paninhos quentes: milhões de bebés
aguardam congelados que se lhes dê um destino e este é, normalmente, o caixote
do lixo! Se isto é preservar a vida indefesa, eu sou a próxima rainha de
Inglaterra!
Quando é que os movimentos “Pela Vida” se deixam de hipocrisias e começam a
condenar a fertilização in vitro? É uma questão de coerência!
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