Rapaziada e
pastorinhos
Uns para
ninhos
Os outros
para alimentar o gado
Todos
precisámos da tua abundante folhagem. Lembras-te
Que também
vieram numa tarde de agosto mães e filhas
Que se
sentaram afogueadas à tua sombra
Umas a fazer
meia
E as outras
a dobar meadas?
Este excerto do poema Romance do
Velho Freixo é representativo do intuito da autora: mostrar, nos dias de
hoje, como as árvores faziam parte da vida das pessoas, sempre presentes no seu
quotidiano, mesmo nas manifestações religiosas:
Com o
raminho de oliveira
Respingou a
água benzida o Padre
E abençoou
depois os quatro cantos da casa.
(In Um Raminho de Oliveira e Um Copo
de Água Benta)
Ao recordar as cenas da sua infância, os poemas de Isabel Maria Fidalgo
Mateus, acompanhados das lindíssimas ilustrações de Cristina Borges Rocha (como se vê pela capa),
apelam igualmente ao preservar da Natureza, tão esquecida e, muitas vezes,
maltratada.
O zimbro não
é uma árvore qualquer…
Agora, já
não cresce abundante, entre fragas,
Já ninguém
lhe leva lanternas de azeite
Para lhe
iluminar os ramos e anunciar as festas luminosas do Menino
Agora, já
não fica com os pregos para lhe pendurarem luz no próximo ano
E perdeu a
vez na hierarquia natalícia…
Mas, talvez,
tenha ganho esperança no Futuro
Enquanto não
vier fogo
Que lhe
chamusque o toucado altaneiro
Ou lhe
tragam os humanos outras e mais desavenças
E o consumam
por inteiro,
Ao pinheiro de
Natal.
(In Zimbro, o Pinheiro de Natal)
Esta preocupação ecológica está aliás patente no prefácio de Miguel
Geraldes*, com o título Imaginário de
Tempos Idos: «o interesse destes textos transcende largamente o âmbito
literário, pois servem o propósito também nobre da sensibilização ambiental da
realidade social portuguesa no início deste século XXI».
Já no fim, nas Notas Para o Novel
Naturalista, Manuel Geraldes refere, uma a uma, todas as árvores que
inspiraram os poemas com o seu nome científico, acompanhado de um curto texto
informativo, na esperança de que «esta obra poderá, quem sabe, despertar a
vontade de conhecer um pouco mais».
Trata-se, por isso, de um livro precioso, que merecia constar do Plano
Nacional de Leitura, ao lado de um outro livro desta autora (que dele já consta):
O Trigo dos Pardais.
Apesar de ser indicado para todas as idades, seria, na minha opinião, excelente
material de trabalho escolar, por aliar a literatura à consciência ambiental. Por
a edição em papel ter sido limitada, a autora pôs o livro à disposição, para
descarregamento gratuito, em:
Não queria terminar sem deixar de referir o poema Ai amoras, ai amoras da amoreira velha, inspirado na cantiga de
amigo de Dom Dinis, Ai flores, ai flores
do verde pino, do qual deixo aqui as primeiras quatro estrofes:
- Ai amoras,
ai amoras da amoreira velha,
Se sabeis
onde encontrar a pintura da infância!
Ai Deus, onde está ela?
Ai amoras,
ai amoras da amoreira antiga,
Se sabeis
onde encontrar a pintura da meninice!
Ai Deus, onde está ela?
Se sabeis
onde encontrar a pintura da infância,
Aquela que
desbotou e perdeu a fragrância!
Ai Deus, onde está ela?
Se sabeis
onde encontrar a pintura da meninice
Aquela que
desbotou e ganhou o perfume da velhice!
Ai Deus, onde está ela?
*Investigador Associado do Centro de Estudos Geográficos da Universidade de
Lisboa e Vice-presidente da Liga para a Proteção da Natureza
Boa tarde Cristina,
ResponderEliminarUma bela entrada: «um livro precioso». Obrigada! Já chegava esta apreciação para quem realmente pensou que este livro pudesse vir a representar algo de belo. Aliás, a harmonia deste livro entre Arte & Ciência resulta da parceria, como bem referes, da ilustradora Cristina Borges e do cientista da natureza Miguel Geraldes. Os poemas são um bom pretexto para que a obra nascesse...
Agradeço mais uma vez a tua sensibilidade e capacidade crítica para retirar do texto o que é realmente pertinente.
Obrigada!
Beijinho,
Isabel
Olá Isabel, foi com muito prazer que li e falei sobre o teu livro. Desejo-te muito sucesso, acima de tudo, que as escolas comecem a investigar melhor o que se publica.
ResponderEliminarBeijinho :)