Este é um interessante romance sobre o reinado de D.
Fernando, um rei que, apesar de ter ficado conhecido pela importante Lei das
Sesmarias, teve um reinado bastante caótico, talvez se possa mesmo dizer
improdutivo. Conduziu Portugal a guerras desnecessárias, fez um casamento
problemático e, à sua morte, o reino caiu numa grave crise de sucessão, só
resolvida com a vitória do Mestre de Avis na Batalha de Aljubarrota.
A caracterização que Jorge Sousa Correia faz de D.
Fernando é acompanhada de grande ironia, o que até se justifica e cria momentos
de facto hilariantes. No entanto, é uma caracterização muito distante, ou seja,
o romancista vê a sua personagem de longe e limita-se a comentar, sem tentar
explicar as suas motivações. É uma opção. Porém, agrada-me mais uma maior
aproximação à personagem, dando a conhecer os seus motivos, conflitos e
sentimentos.
Jorge Sousa Correia é licenciado em História e foi
professor dessa disciplina. Tem naturalmente um bom conhecimento da época. Por
outro lado, usa e abusa de anacronismos. Por exemplo: um patrão de uma taberna dizer a uma das
prostitutas que lá trabalham que não pode estar «mais do que cinco minutos com
um cliente», num tempo em que ninguém usava relógio, pois todos se guiavam pelo
sol, é inconcebível. As pessoas daquele tempo nem sequer sabiam o que eram
minutos e segundos.
Também não apreciei a forma de caracterizar os
ingleses que se instalaram em Portugal, a fim de ajudarem D. Fernando na sua
guerra contra Castela. Provocaram muitos desacatos em Lisboa, mas mais por incompetência
do rei em impor a ordem, do que por qualquer outro motivo. Ora, Jorge Sousa
Correia descreve-os como modernos hooligans: homens
violentos, que só sabem beber e andar à pancada e, não tendo portugueses em
quem bater, «vá de andar ao murro uns com os outros». Enfim… Além disso, apelida-os,
muitas vezes, de bretões, tendo eu sérias dúvidas se estará correta esta
designação.
Uma última palavra para a taberna de Mariamem e do
Falcão, local lisboeta de diversão noturna, onde se vão comentando as
novidades. Em si, é uma boa ideia apresentar muito do que aconteceu no reinado
de D. Fernando sob uma perspetiva popular. Por outro lado, o autor trata, na
minha opinião, a vida das prostitutas que lá trabalham com leveza exagerada. Na
Idade Média, as prostitutas encontravam-se no patamar mais baixo da sociedade, a
sua vida era marcada por violência, desprezo total e graves problemas de saúde. Ora, as “meninas de
Mariamem” são criaturas muito bem-dispostas, que aceitam todas essas vicissitudes
de ânimo leve. A taberna de Mariamem é um paraíso para homens. E a leitura
deste romance também se adequa mais ao setor masculino, diria eu.