Não se trata de um filme, a cena não tem nada de fictício, é real, a câmara foi tolerada naquele encontro por alguns momentos, a fim de ser feito o documentário. E o arquitecto Sebastián Marroquín, que vive na Argentina, foi baptizado com outro nome, na sua Colômbia natal. Mudou-o, quando se viu obrigado a fugir do país. O seu verdadeiro nome é Juan Pablo Escobar, filho de Pablo Escobar, o barão da droga colombiano, morto em 1993, tinha ele 16 anos. Os outros quatro homens são filhos de políticos assassinados a mando de Escobar, nos anos 80, quando declararam guerra ao barão da droga.
Pablo Escobar com o filho Juan Pablo, em 1980 |
Sebastián Marroquín tem dificuldades em viver com a "herança" que o pai, que chegou a ser o criminoso mais procurado do planeta, lhe deixou. Vê-se aflito para conciliar a imagem do pai carinhoso, que lhe satisfazia todos os desejos (a família nadava em dinheiro), com o criminoso, que não hesitava em mandar assassinar quem o incomodasse. A sua primeira reacção, ao saber da morte dele, foi declarar, a uma jornalista, num telefonema gravado, que iria tomar o seu lugar, continuar a sua "obra", vingando-se daqueles que o mataram.
Pablo Escobar com o filho Juan Pablo, turistas em Washington |
Mas esta foi uma reacção a quente, diz ele hoje, quando tinha apenas 16 anos e vivia escondido num hotel de Bogotá, com a mãe e a irmã, protegidos pela polícia, enquanto a Colômbia inteira procurava pelo paradeiro de Escobar. Passados esses momentos de fúria, Sebastián Marroquín decidiu-se pela paz. O sentimento de culpa, porém, persiste. Levou-o a contactar os filhos dos dois conhecidos políticos colombianos, a fim de lhes pedir desculpa.
Nem todos responderam de imediato, afinal, alguns deles tinham apenas 7 anos, quando os pais foram assassinados a sangue frio. Num dos assassinatos, em pleno comício eleitoral para a Presidência da Colômbia, havia câmaras, as imagens existem. A 18 de Agosto de 1989, o candidato Luis Carlos Galán cai, talvez já morto, em cima do palanque, atingido por tiros de metralhadora. Gera-se o pânico. Com esforço, o seu corpo inanimado é metido num carro, a fim de ser transportado a um hospital, na tentativa desesperada de salvar o que já não pode ser salvo.
Sebastián Marroquín (Juan Pablo Escobar), hoje, arquitecto na Argentina |
Ignorar o passado é ignorar uma parte de nós, é não assumir as responsabilidades, é varrer para debaixo do tapete. Sebastián Marroquín, além de consentir no documentário, arriscou viajar à Colômbia, onde a sua vida corre perigo. Porque há ainda muita gente que deseja vingar-se do pai, através dele. Outros têm medo das revelações que ele possa fazer. Mas Sebastián Marroquín tem a coragem de mostrar ao mundo que é diferente de Pablo Escobar, pois, nas suas próprias palavras: o caminho mais rápido e seguro para a paz passa pelo perdão e pela reconciliação. É preciso mais coragem para estabelecer a paz do que para fazer a guerra. Destruir, é fácil (tradução minha, do alemão).
É suposto os pais ensinarem-nos a viver. Muitas vezes, temos que aprender a viver, apesar deles.
Nota: O documentário foi apresentado no Canal Arte, no passado dia 23 de Fevereiro. Será repetido a 8 de Março, às 2:30 horas (serão 1:30 horas, em Portugal). Título, em francês: Les péchés de mon père.
Gostei de ter conhecido Sebastián Marroquín e a sua nobreza de espírito.
ResponderEliminarParabéns pelo excelente texto!
"Ignorar o passado é ignorar uma parte de nós".
De alguma forma as vitimas do seu pai se podem ver aqui algum sentido de justiça e de esperança, o monstro não se reproduziu.
ResponderEliminarGostei de ter conhecido este exemplo e do teu texto.
Obrigada aos dois :)
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