Em todos os momentos da História, seja na Antiguidade, na Idade Média, ou no nosso tempo, são as mesmas paixões e os mesmos desígnios que inspiram os humanos. Entender a História é entender melhor a natureza humana.

8 de março de 2011

Melhor Livro Estrangeiro

Os franceses podem ter muitos defeitos, mas sempre tiveram bom gosto literário e Paris foi (mais do que é) uma cidade-refúgio para escritores de diversas nacionalidades. O Prix du Meilleur Livre Étranger 2010 é uma garantia de qualidade. Fica-se curioso, embora não se possa evitar um certo cepticismo, afinal, há gostos pessoais.

Através d' O Cheiro dos Livros, tenho vindo a entrar em contacto, precisamente, com a obra vencedora deste Prix.




«A natureza está à espera, lá fora, mas mantém exactamente a mesma força: recuou, é certo, mas não está sequer prisioneira. Está num outro sítio, num outro ponto da batalha, e afia as lâminas; não reza, não suplica, não pede piedade.

«O Dr. Lenz, cirurgião importante da cidade, homem possuidor absoluto dos seus prazeres privados, apreciador de pequenas humilhações a prostitutas, e que ganhara o hábito recente de receber em casa um vagabundo, de lhe oferecer esmolas chorudas, de lhe dar pão e comida, e acima de tudo, de o humilhar, de atrasar a esmola, a comida, de saborear o prazer de estar na parte forte e de ter dois olhos sãos e claros para ver o que a claridade do mundo mostrava: a rudeza desse mesmo mundo, a violência e a indiferença entre quem tem saúde e quem não a tem, quem tem dinheiro e quem não o tem, quem é velho e quem não o é, quem é feio ou deficiente e quem não o é, quem tem marcas de acidente no rosto, queimaduras, cortes que desfiguram a beleza média e quem, pelo contrário, não tem nada que manche o seu orgulho, o seu orgulho exterior, físico, a única moeda comum a todos os séculos, a todos os países, a todas as línguas. Era isto que os olhos sãos e claros de Lenz viam, era isto que a claridade do mundo lhe mostrava.»

«- Nesta casa o medo é ilegal – era uma das frases mais marcantes de Frederich Buchmann.


O único problema, neste tipo de escrita, é o ritmo alucinante das frases de qualidade. Sucedem-se umas às outras, quase se anulando, quase evitando o seu desfrutar. Há escritores assim, que se têm de ler devagar. E várias vezes. Em vez de enfado, a repetição proporciona-nos novas revelações, novos encantos.


Descobri mais um motivo de entusiasmo para minha ida a Portugal, por alturas da Feira do Livro do Porto. Já acrescentei o Gonçalo M. Tavares à minha lista :-)

5 comentários:

  1. Bom, creio que não será o único que irás comprar na Feira do Livro... de Lisboa :P
    (mas traz a cadela açaimada)

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  2. três coisas:

    - Já anotei o livro para futura compra.

    - Feira do Livro no Porto. Avisa que eu moro perto do Porto e tenho aqui um livro para ser ortografado.

    - Conheço um blogue que pode te interessar, não sei se conheces:

    http://dejalu4ds.blogspot.com/

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  3. fallorca, costumo deixar a bichinha com gente conhecida, que toma bem conta dela. Mas custa-me, sei que ela sente a nossa falta...

    Daniel, aviso. E já tinha em vista visitar esse blogue, obrigada.

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  4. O GMT é de uma escrita espartana e dura. Não é de descrever os seus personagens ou ambientes. Como dizia Saramago, GMT escreve também que até apetece bater-lhe...

    Fico feliz por o Daniel o "ter descoberto" aqui no teu texto.

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  5. Daniel, não conhecia, obrigado

    antónio, esse elogio de Saramago é a maior demonstração de ternura que conheci entre escritores :)

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