Em todos os momentos da História, seja na Antiguidade, na Idade Média, ou no nosso tempo, são as mesmas paixões e os mesmos desígnios que inspiram os humanos. Entender a História é entender melhor a natureza humana.

1 de julho de 2012

O Português levou 8 séculos a construir,

não será por decreto que o irão destruir.

Se o Português levou 8 séculos a construir, os nossos antepassados falavam uma língua incompleta, uma língua em construção, em obras. D. Dinis, Gil Vicente, Camões, Camilo, Eça... Estavam eles conscientes disso? Pode chamar-se obra-prima àquela que foi escrita numa língua em construção? Sabiam Gil Vicente e Camões que ainda tinham de passar séculos, até que o Português estivesse plenamente construído?

Esta frase, muito usada pelos oponentes do Acordo Ortográfico, é, na minha opinião, infeliz, porque encerra, em si, uma contradição. Por um lado, admite que a língua portuguesa é o resultado de uma evolução; por outro, dita o seu bloqueio. Mais: pressupõe que o Português atingiu, enfim, a sua perfeição! Com que direito? É o Português que falamos e escrevemos hoje melhor do que o que falava e escrevia Camões? É o Português que falamos e escrevemos hoje aquele que os nossos sucessores falarão e escreverão daqui a 500 anos?

Nenhum decreto destrói o Português, apenas lhe introduz alterações em aspetos considerados obsoletos. A questão não me repugna, por isso a aceito. Não por ser de natureza submissa - como caracterizam os oponentes do Acordo aqueles que o aceitam -, mas pura e simplesmente porque a questão não me repugna. A língua tem uma origem convencional. Convencionou-se chamar "mesa" à "mesa" e "cadeira" à "cadeira". Em alemão, convencionou-se chamar "Tisch" à "mesa" e "Stuhl" à "cadeira". Depois de anos de evolução, claro. Mas considerar que essa evolução chegou ao fim é tão absurdo como considerar que "actor" e "ator" se pronunciam de maneira diferente.

Muitos opositores do Acordo alegam, ainda, que, na palavra "ator" não se vislumbra a sua raiz. E em quantas palavras portuguesas se vislumbra a sua raiz? Se tudo fosse assim tão claro, não havia dúvidas quanto à origem da palavra "fado", por exemplo. A maior parte das palavras está tão modificada, devido à evolução da língua, que não é possível descortinar a sua raiz.

Os opositores costumam também dizer que querem continuar a escrever como aprenderam. E o que dirão os seus filhos, daqui a vinte anos, os filhos que estão a aprender a escrever usando as regras do Acordo Ortográfico?


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