Este foi o primeiro livro que li de Mario Vargas Llosa e confesso que me
custou a entrar na sua escrita. Talvez por os dois primeiros contos (dos sete
que compõem esta obra) terem sido escritos durante a juventude do escritor nascido
em 1936 e que viria a ganhar o Prémio Nobel em 2010. Os Chefes, de 1959, que aqui, curiosamente, surge em segundo lugar,
foi a primeira obra publicada pelo escritor peruano; Os Cachorros, o primeiro conto desta série, data de 1967. Tanto num,
como no outro, nota-se, a meu ver, a falta de amadurecimento do autor.
Em Os Chefes, achei a escrita
arrogante, na medida em que o autor nos introduz num mundo que não conhecemos,
sem o explicar, como se todos tivéssemos a obrigação de saber do que se trata. Deu-me
a impressão de que Llosa escreve, acima de tudo, para si mesmo, o que entendo
como um erro de principiante. Quando entrei no cenário - a revolta dos estudantes
num colégio - comecei a apreciar o estilo, mas a escrita, de tão económica,
mantém-se pouco clara até ao fim. Além disso, há imagens difíceis, ou mesmo
impossíveis, de visualizar, como: «Tinha muito abertos os seus enormes olhos
verdes e sorria» (p. 73).
Em Os Cachorros, Llosa adota o
estilo que corre ao ritmo do pensamento, quase sem pontuação, a não ser as
vírgulas, parecido com Saramago. É uma experiência interessante, mas penso que o
autor não se sente muito à vontade para soltar o seu talento. A prova é que, nos
outros contos, que se pautam pela pontuação tradicional, sobressaem as
verdadeiras capacidades de Llosa. Também as “fraquezas” que apontei para Os Chefes desaparecem nos outros cinco
contos. A escrita torna-se muito mais clara e concisa, o leitor pode
concentrar-se mais no conteúdo, o que aumenta consideravelmente o prazer da
leitura.
Todos os contos nos mostram uma sociedade violenta e machista, a sociedade
sul-americana na qual o autor cresceu. É mesmo impressionante a violência que
impera entre crianças e jovens do sexo masculino, um sistema pautado, desde
cedo, pela concorrência e pela lei do mais forte, sem lugar para o sentimento,
mesmo quando se está apaixonado. Todos os conflitos são resolvidos com agressividade
e o correr de sangue, mesmo entre os estudantes mais novos. Como em O Deus das Moscas, somos levados a
acreditar que é esta a prova de que os humanos são essencialmente cruéis, tese
que eu contradigo, pois estas crianças e jovens já não são naturais,
contaminados, desde o berço, por uma educação agressiva e desrespeitadora das
suas necessidades e dos seus problemas. Sobre isso, porém, escreverei ainda
noutro post.
Apesar de alguma desilusão nos dois primeiros contos, esta minha primeira
leitura de Llosa acabou por me abrir o apetite para outras obras do autor.
Gosto do estilo económico e conciso, mesmo que pressinta que estará marcado
pela educação machista, que incluiu o internato num colégio militar. Não digo
que Llosa não terá, mais tarde, alargado os seus horizontes, mas a base, penso,
estará sempre lá.
O Llosa é um escritor fantástico, um pouco difícil às vezes mas vale a pena o esforço. Esse ainda não li, mas posso confirmar que as coisas tendem a ser um pouco violentas. O mundo é assim mesmo afinal de contas. Em relação ao machismo já li piores...Por essa ordem todos os autores masculinos teriam de ser necessariamente machistas visto que todos nasceram e viveram em sociedades assim. Ele é bastante irónico quando escreve sobre as instituições militares.
ResponderEliminar¿Quién mató a Palomino Molero?
ResponderEliminarGenial!
Sara, eu, por acaso, não referi que o Llosa se limita a descrever, sem comentar, ou seja, o que ele descreve é um mundo machista, mas sem fazer a sua apologia, ou algo do género. Não usa, no entanto, qualquer ironia e as personagens femininas (quando as há) são pouco simpáticas, do estilo: só servem pata causar agruras aos rapazes e homens. Mas acredito que isso se modifique mais tarde. Como disse, estes contos são das primeiras coisas que escreveu.
ResponderEliminar"para" em vez de "pata", obviamente
ResponderEliminarObrigada ao outro comentador pela sugestão.
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